sexta-feira, 19 de julho de 2013

Um problema chamado…Enfermagem.

A situação da Enfermagem em Portugal não está bem, como não estão bem muitas outras profissões…aliás, o país não está bem. A culpa? Não é dos enfermeiros, não é dos professores, não é dos empregados têxteis, não é das pessoas de hotelaria, não é dos médicos nem engenheiros…a culpa é do desgoverno eterno deste país à beira mar plantado e de nos terem feito crer que, numa determinada altura, podíamos ter mais do que realmente podíamos.
Porém a situação da minha profissão, a meu ver, é mais complicada. E passo a explicar.
É sempre mais fácil quando a frente da batalha é comum, quando há algo que une toda a gente e os leva para a guerra. Isso é tudo, menos o que passa em Enfermagem. Todos reclamam, nenhum pelo mesmo.
Eu, e muitos milhares, desde que acabamos o curso, vimos a reclamar uma oportunidade de trabalhar no nosso país. Não daquelas de trabalhar de graça ou quase de graça, a falsos recibos verdes, a milhentas horas semanais. Não, não somos supra exigentes, apenas pedimos condições minimamente dignas. Aliás, ao emigrar e não aceitar estas míseras condições, somos os primeiros a exigir mais dignidade no tratamento à nossa profissão. Acredito que se isso acontecesse, muitos que estão emigrados, mesmo tendo melhores condições fora do país, voltariam porque o dinheiro ainda não paga tudo.
Neste momento, somos apenas números que servem para passar uma imagem de coitadinhos e somos uma espécie de tomates podres para atirar ao governo. A verdade é que somos um fardo e ainda bem que já não estamos no país. Já não entramos para nenhumas contas. Esta seria uma das frentes da batalha, que podia juntar à luta milhares de combatentes…mas não interessamos, então pedimos que nos deixem de usar como arma de propaganda.
Depois há outras reivindicações, estas das pessoas que trabalham em Portugal. Mesmo aqui não encontramos uma luta comum. Primeiro, porque há enfermeiros do público e do privado (também há os parceiros público-privados), há filhos e enteados. Os primeiros estão mal, mas os segundos estão piores. E seria tão fácil regulamentar as questões contratuais e salariais, bastando haver vontade das entidades competentes. Aqui em Espanha, o privado, pagando muito ou pouco, tem acordado com os sindicatos todos os tipos de contrato. Nenhum se atreve a pagar abaixo do que foi acordado, nem a não pagar todos os direitos aos trabalhadores. Os enfermeiros do privado em Portugal não reclamam das 40h semanais nem das melhorias contratuais e salariais. Alguns deles queriam era trabalhar as 40h semanais, ter um contrato e um salário um pouco digno. Claro que a culpa destas propostas é de quem as faz, mas também de quem as aceita. Não venham com a desculpa que é o desespero de querer trabalhar e ganhar algum (que nem para as viagens dá). Muitos o fazem porque querem ficar perto de casa, junto de amigos e familiares (aquilo que quem emigra abdica).
Depois há outros focos de batalha, mas mesmo entre os trabalhadores no sector público, há a questão dos filhos e enteados. Mas neste caso a luta ganha contornos comuns, porque o que beneficia uns, cedo ou tarde beneficiará os outros. Posso estar errado, porque é o foco em que menos estou à vontade, uma vez que nunca o vivi.
Uma das principais lutas, além das melhorias salariais (luta sempre justa), é a luta pelas 35 horas semanais. Acho muito bem, tendo em conta os motivos apresentados, o desgaste físico e psicológico extremo da profissão e maior disponibilidade para ter tempo de qualidade com a família. Agora convém esclarecer que é mesmo por estes motivos e não para se ir fazer umas horas extras (ou turnos completos) noutro sítio qualquer. Porque sendo a nossa profissão tão extenuante como é (seja privado ou público), como há colegas a sair de um turno de 8 horas ou mais e a engatar logo noutro de 8 horas ou mais? Já não é extenuante? Mais importante, estarão assegurados os cuidados aos doentes como deve ser? Não acredito. Além que vi pessoas destas a descurar um turno porque ainda iam ter que fazer outro noutro local. Um pouco de coerência exige-se, apesar de saber que muitos lutam pelas 35h devido aos motivos atrás referidos.
Mas ainda há mais focos de batalha, hoje em dia com os novos enfermeiros especialistas a exigirem o seu reconhecimento no mercado laboral. A minha opinião sobre este assunto é a seguinte (já escrevi um texto aqui sobre isso)…com o panorama atual da Enfermagem, em que um especialista trabalha numa área que não tem nada a ver com a especialidade, ganha o mesmo e tem o mesmo nível de responsabilidade…a especialidade tem valor 0 a nível profissional, a nível de conhecimentos e capacidades adquiridas (a nível de capacidades apenas para os que trabalham) terá muito mais que esse valor. Para as especialidades terem valor, teria que se fazer como os médicos, sempre tão inimigos da enfermagem, mas que resolveram estas questão de uma forma muito simples e inteligente. Quem acaba o curso tem que tirar especialidade e vai trabalhar na sua área.
Ainda quanto às especialidades, exige-se ainda maior reconhecimento a nível de concursos, mas aqui a porca torce o rabo e eu o nariz. Há enfermeiros especialistas que eu os reconheço como verdadeiros especialistas (alguns com especialidade e outros sem ela) e outros que são especialistas da teoria. Como se pode dar muito valor a algo que hoje em dia perde valor a cada dia que passa? Que se oferece em muitas universidades? (novo meio de ganhar dinheiro) Muitos colegas acabam o curso e tiram logo especialidade (ideal num sistema como o dos médicos), com experiência profissional de 0 horas, estarão mais aptos para desempenhar funções que um enfermeiro generalista com anos de prática e perícia? Eu sei a resposta, mas deixo a questão.

Há entidades responsáveis por nós que apenas se preocupam com o dinheiro que temos que pagar, por muito que digam que não são cargos remunerados. Há outras maneiras de usufruir das coisas. Quem o desconhece, ou não vive neste mundo ou quer encobrir algo. Enquanto isso, andamos à deriva como o resto do país…

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