terça-feira, 11 de julho de 2017

Duas pequenas heroínas

Ontem desloquei-me para mais um treino, mais um treino a promover a arte a jovens desconhecidos, inserido no programa de férias desportivas. Algo que me tem chamado muito a atenção nestes treinos, é o incrível interesse que as crianças têm pelo Karate, pelo treino em si e a disciplina que apresentam.
Falamos de crianças dos 6 aos 12 anos, crianças que nunca tinham contactado com o Karate e que assimilam rapidamente os passos iniciais desta arte…saudação, respeito pelo Sensei e pelos colegas, entrega ao treino etc. Quando assim é, dá real gosto dar um treino, não cansa e o tempo passa a voar. Fazem corar de vergonha muitas crianças já crescidinhas, que não sabem estar e, sinceramente, para as quais cada vez tenho menos paciência.
Ao alinhar as crianças verifiquei que uma delas era portadora de Síndrome de Down. Nunca tal me tinha sucedido, mas não fiquei intranquilo. Um defeito meu, que vou aprimorando nesta minha curta vivência como treinador, é acreditar que posso tirar sempre alguma coisa de todas as crianças, tenham elas os problemas que tiverem. Por isso iniciei o treino ansioso por ver a resposta que a menina me ia dar. Fez o treino todo sem se notar qualquer diferença para os colegas, até executando muito melhor do que outros.
Ao iniciar o treino, reparei também que uma aluna estava sentada, sem fazer o treino, por indicação de uma responsável por eles. Não sabia o motivo, mas é normal haver sempre algum doente, logo não dei importância. Com o decorrer dos exercícios, a menina levanta-se e começa a correr e a repetir os movimentos que eu fazia. Uma corrida desequilibrada…um esboço dos movimentos. Uma voz muda, mas um olhar que tudo dizia. Percebi que era uma aluna com alguma coisa parecida a paralisia cerebral.
Uma colega dela, rapidamente e preocupada disse-me “Ela não pode treinar!” Perguntei o porquê e a resposta foi “É deficiente”. Tranquilizei a rapariga e disse-lhe que era eu a dar o treino e que, enquanto assim fosse, ela ia treinar. Como podia eu negar o treino à pessoa que mais interessada nele estava?

Foi, talvez, dos treinos em que mais aprendi. São estas alturas que me ensinam a relativizar, a relativizar os meus “problemas” ou a relativizar a importância que damos às coisas sem valor. Aquelas duas meninas são, para mim, um exemplo de querer e de superação, são minhas heroínas.


1 comentário:

  1. Se soubesses o quanto lamento por viver longe de ti!...
    Tenho certeza absoluta de que serias mais um forte apoio e um reforço às muitasss terapias do Dudu.
    Olha... Gosto de ti e pronto!

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