quinta-feira, 25 de julho de 2013

Consternação...

Consternação…é o sentimento que me invade neste momento.
Ontem chego ao local de trabalho perto das 22h e alguém comenta que houve um acidente de comboio perto de Santiago de Compostela. Por curiosidade, procuramos nas notícias a ver se diziam algo…longe de imaginarmos o cenário dantesco que estamos prestes a ver.
Não sou de me impressionar com estas coisas, mas ontem impressionei-me ao ver uma televisão sem escrúpulos a filmar a retirada dos corpos inertes das carruagens. Acidentes acontecem, eu sei. Mas, não sendo eu espanhol, senti este de muito perto. Esta gente, neste momento, já é um pouco a minha gente. Acolheram-me há cinco anos e não consigo ficar indiferente.
A última notícia que ouvi, falava em 77 mortos e um número incontável de feridos, alguns deles em estado grave, não se sabendo qual será a sua evolução.
Muitas vezes diz-se que os médicos, enfermeiros, bombeiros ou polícias têm a vida das pessoas nas suas mãos. Mas não somos os únicos. Um piloto de avião, um condutor de autocarro ou um maquinista de um comboio…esses são aqueles que têm mais vidas sob a sua responsabilidade ao mesmo tempo.
Não se sabe ainda a causa, adianta-se, de forma perigosa, que tenha sido excesso de velocidade. Mas mesmo que tenha sido, que terá ocasionado esse excesso? Descuido, falta de atenção ou excesso de trabalho do maquinista?
É por isso que quando se fala em aumentar as horas de trabalho das pessoas, muitas vezes faz-se sem olhar ao tipo de trabalho e à responsabilidade que acarretam. Pensa-se em números, não se pensa nas consequências. Falando de enfermagem, eu não sei como há colegas que conseguem ir trabalhar (de consciência tranquila) após uma noite de festa ou que engatam turnos atrás de turnos. Eu não consigo. Se há algo que acho tão desgastante como lidar com o sofrimento dos doentes, é a atenção que temos que ter ao erro, ou melhor, em não errar.
A vida de um doente está nas minhas mãos, assim como a minha está na de um motorista ou maquinista. É uma questão de responsabilidade.
Esta noite foi uma noite de pesar neste país, uma noite de profunda tristeza, mas ao mesmo tempo de perseverança e de união na tentativa de ajudar o próximo. Sei que agora é fácil dizê-lo e não o digo para que acreditem ou não em mim…mas ontem, se estivesse em casa àquela hora, pegava no carro e ia para Santiago. O meu papel de enfermeiro vai muito mais além do local onde eu trabalho.

A Espanha e, principalmente, a Galiza estão de luto…e eu acompanho-os neste momento difícil.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Um problema chamado…Enfermagem.

A situação da Enfermagem em Portugal não está bem, como não estão bem muitas outras profissões…aliás, o país não está bem. A culpa? Não é dos enfermeiros, não é dos professores, não é dos empregados têxteis, não é das pessoas de hotelaria, não é dos médicos nem engenheiros…a culpa é do desgoverno eterno deste país à beira mar plantado e de nos terem feito crer que, numa determinada altura, podíamos ter mais do que realmente podíamos.
Porém a situação da minha profissão, a meu ver, é mais complicada. E passo a explicar.
É sempre mais fácil quando a frente da batalha é comum, quando há algo que une toda a gente e os leva para a guerra. Isso é tudo, menos o que passa em Enfermagem. Todos reclamam, nenhum pelo mesmo.
Eu, e muitos milhares, desde que acabamos o curso, vimos a reclamar uma oportunidade de trabalhar no nosso país. Não daquelas de trabalhar de graça ou quase de graça, a falsos recibos verdes, a milhentas horas semanais. Não, não somos supra exigentes, apenas pedimos condições minimamente dignas. Aliás, ao emigrar e não aceitar estas míseras condições, somos os primeiros a exigir mais dignidade no tratamento à nossa profissão. Acredito que se isso acontecesse, muitos que estão emigrados, mesmo tendo melhores condições fora do país, voltariam porque o dinheiro ainda não paga tudo.
Neste momento, somos apenas números que servem para passar uma imagem de coitadinhos e somos uma espécie de tomates podres para atirar ao governo. A verdade é que somos um fardo e ainda bem que já não estamos no país. Já não entramos para nenhumas contas. Esta seria uma das frentes da batalha, que podia juntar à luta milhares de combatentes…mas não interessamos, então pedimos que nos deixem de usar como arma de propaganda.
Depois há outras reivindicações, estas das pessoas que trabalham em Portugal. Mesmo aqui não encontramos uma luta comum. Primeiro, porque há enfermeiros do público e do privado (também há os parceiros público-privados), há filhos e enteados. Os primeiros estão mal, mas os segundos estão piores. E seria tão fácil regulamentar as questões contratuais e salariais, bastando haver vontade das entidades competentes. Aqui em Espanha, o privado, pagando muito ou pouco, tem acordado com os sindicatos todos os tipos de contrato. Nenhum se atreve a pagar abaixo do que foi acordado, nem a não pagar todos os direitos aos trabalhadores. Os enfermeiros do privado em Portugal não reclamam das 40h semanais nem das melhorias contratuais e salariais. Alguns deles queriam era trabalhar as 40h semanais, ter um contrato e um salário um pouco digno. Claro que a culpa destas propostas é de quem as faz, mas também de quem as aceita. Não venham com a desculpa que é o desespero de querer trabalhar e ganhar algum (que nem para as viagens dá). Muitos o fazem porque querem ficar perto de casa, junto de amigos e familiares (aquilo que quem emigra abdica).
Depois há outros focos de batalha, mas mesmo entre os trabalhadores no sector público, há a questão dos filhos e enteados. Mas neste caso a luta ganha contornos comuns, porque o que beneficia uns, cedo ou tarde beneficiará os outros. Posso estar errado, porque é o foco em que menos estou à vontade, uma vez que nunca o vivi.
Uma das principais lutas, além das melhorias salariais (luta sempre justa), é a luta pelas 35 horas semanais. Acho muito bem, tendo em conta os motivos apresentados, o desgaste físico e psicológico extremo da profissão e maior disponibilidade para ter tempo de qualidade com a família. Agora convém esclarecer que é mesmo por estes motivos e não para se ir fazer umas horas extras (ou turnos completos) noutro sítio qualquer. Porque sendo a nossa profissão tão extenuante como é (seja privado ou público), como há colegas a sair de um turno de 8 horas ou mais e a engatar logo noutro de 8 horas ou mais? Já não é extenuante? Mais importante, estarão assegurados os cuidados aos doentes como deve ser? Não acredito. Além que vi pessoas destas a descurar um turno porque ainda iam ter que fazer outro noutro local. Um pouco de coerência exige-se, apesar de saber que muitos lutam pelas 35h devido aos motivos atrás referidos.
Mas ainda há mais focos de batalha, hoje em dia com os novos enfermeiros especialistas a exigirem o seu reconhecimento no mercado laboral. A minha opinião sobre este assunto é a seguinte (já escrevi um texto aqui sobre isso)…com o panorama atual da Enfermagem, em que um especialista trabalha numa área que não tem nada a ver com a especialidade, ganha o mesmo e tem o mesmo nível de responsabilidade…a especialidade tem valor 0 a nível profissional, a nível de conhecimentos e capacidades adquiridas (a nível de capacidades apenas para os que trabalham) terá muito mais que esse valor. Para as especialidades terem valor, teria que se fazer como os médicos, sempre tão inimigos da enfermagem, mas que resolveram estas questão de uma forma muito simples e inteligente. Quem acaba o curso tem que tirar especialidade e vai trabalhar na sua área.
Ainda quanto às especialidades, exige-se ainda maior reconhecimento a nível de concursos, mas aqui a porca torce o rabo e eu o nariz. Há enfermeiros especialistas que eu os reconheço como verdadeiros especialistas (alguns com especialidade e outros sem ela) e outros que são especialistas da teoria. Como se pode dar muito valor a algo que hoje em dia perde valor a cada dia que passa? Que se oferece em muitas universidades? (novo meio de ganhar dinheiro) Muitos colegas acabam o curso e tiram logo especialidade (ideal num sistema como o dos médicos), com experiência profissional de 0 horas, estarão mais aptos para desempenhar funções que um enfermeiro generalista com anos de prática e perícia? Eu sei a resposta, mas deixo a questão.

Há entidades responsáveis por nós que apenas se preocupam com o dinheiro que temos que pagar, por muito que digam que não são cargos remunerados. Há outras maneiras de usufruir das coisas. Quem o desconhece, ou não vive neste mundo ou quer encobrir algo. Enquanto isso, andamos à deriva como o resto do país…

terça-feira, 16 de julho de 2013

Compadrios, uma praga ou ser bom português?

As redes sociais, no meu caso o facebook, são locais onde se descobre certas coisas, algumas delas estranhas.
Sigo, mais por interesse profissional, um blogger denominado Doutor Enfermeiro (DE). Aborda alguns assuntos ligados à minha área profissional, mas nos últimos tempos tenho conhecido uma parte política (não de partidos, mas dentro da enfermagem) do autor deste blog. Nota-se que é defensor de quem dirige a Ordem dos Enfermeiros (OE), ao contrário de mim. Porém, cada um tem direito à sua opinião, não é isso que está em causa.
Numa troca de ideias num grupo do facebook, também ele ligado à nossa área, este blogger convida alguns colegas a terem uma reunião com o Bastonário da OE, de modo a propor soluções aos nossos problemas e não apenas criticando sem nada fazer. Até aqui tudo bem, ideia a meu ver válida.
A meu ver, o problema surge quando é o autor anónimo do blog que consegue essa reunião com o Bastonário, dizendo algo tipo “É só mandar mensagem, que eu consigo reunião de modo a apresentarem soluções.”
Será que não me consegue uma cunha para trabalhar em qualquer sítio em Portugal?
Numa profissão como a nossa, em que a ética é tão valorizada (e bem), parece-me pouco ético este tipo de influências. Se queremos contactar com a OE, temos os meios oficiais para o fazer (se nos respondem é outra questão…ética?) e não deveria ser necessário um convite, via facebook, de alguém anónimo, para conseguir esse contacto. Aqui já me parece a política e o seu tráfico de influências e compadrios a entrar numa entidade como a OE. Ou seja, um péssimo caminho.
Claro que, como país de velhos costumes, muita gente verá isto como algo normal. Eu não vejo, mas isso sou eu.
Fica mal na fotografia o DE e a OE…mas principalmente a OE, órgão público que devia primar pela transparência nas suas ações. Claro que a OE sabendo disto tem uma solução fácil, pode afastar-se das declarações do DE, dizendo que nada sabem e que esta pessoa não é um agente de reuniões da OE.

Mas uma vez mais, como já referi aqui anteriormente, à OE não basta ser séria, tem que parecê-lo!