Ontem chego ao local de trabalho
perto das 22h e alguém comenta que houve um acidente de comboio perto de
Santiago de Compostela. Por curiosidade, procuramos nas notícias a ver se
diziam algo…longe de imaginarmos o cenário dantesco que estamos prestes a ver.
Não sou de me impressionar com
estas coisas, mas ontem impressionei-me ao ver uma televisão sem escrúpulos a
filmar a retirada dos corpos inertes das carruagens. Acidentes acontecem, eu
sei. Mas, não sendo eu espanhol, senti este de muito perto. Esta gente, neste
momento, já é um pouco a minha gente. Acolheram-me há cinco anos e não consigo
ficar indiferente.
A última notícia que ouvi, falava
em 77 mortos e um número incontável de feridos, alguns deles em estado grave,
não se sabendo qual será a sua evolução.
Muitas vezes diz-se que os médicos,
enfermeiros, bombeiros ou polícias têm a vida das pessoas nas suas mãos. Mas
não somos os únicos. Um piloto de avião, um condutor de autocarro ou um
maquinista de um comboio…esses são aqueles que têm mais vidas sob a sua
responsabilidade ao mesmo tempo.
Não se sabe ainda a causa,
adianta-se, de forma perigosa, que tenha sido excesso de velocidade. Mas mesmo
que tenha sido, que terá ocasionado esse excesso? Descuido, falta de atenção ou
excesso de trabalho do maquinista?
É por isso que quando se fala em
aumentar as horas de trabalho das pessoas, muitas vezes faz-se sem olhar ao
tipo de trabalho e à responsabilidade que acarretam. Pensa-se em números, não
se pensa nas consequências. Falando de enfermagem, eu não sei como há colegas
que conseguem ir trabalhar (de consciência tranquila) após uma noite de festa
ou que engatam turnos atrás de turnos. Eu não consigo. Se há algo que acho tão
desgastante como lidar com o sofrimento dos doentes, é a atenção que temos que
ter ao erro, ou melhor, em não errar.
A vida de um doente está nas minhas
mãos, assim como a minha está na de um motorista ou maquinista. É uma questão
de responsabilidade.
Esta noite foi uma noite de pesar
neste país, uma noite de profunda tristeza, mas ao mesmo tempo de perseverança
e de união na tentativa de ajudar o próximo. Sei que agora é fácil dizê-lo e
não o digo para que acreditem ou não em mim…mas ontem, se estivesse em casa
àquela hora, pegava no carro e ia para Santiago. O meu papel de enfermeiro vai
muito mais além do local onde eu trabalho.
A Espanha e, principalmente, a Galiza
estão de luto…e eu acompanho-os neste momento difícil.
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