Escrevo este
texto a dezoito de março, dia a seguir à vitória sobre o Nacional da Madeira,
mas nada tem a ver com o crer que vamos ser campeões. Para isso tinha-o escrito
logo a seguir ao Benfica-Porto…ou melhor, logo no início da época. Podia tê-lo
escrito logo a seguir às copiosas derrotas com Celta de Vigo (7 a 0) ou com o
Porto (0 a 5), como podia ser depois do épico 6 a 3 com o Sporting ou dos 2 a 0
em casa do campeão europeu Liverpool.
O que é para
mim ser Benfica? Admito que algo tão grande é difícil explicar por simples
palavras. Ficará sempre aquém do verdadeiro sentimento. Como ficam sempre as
palavras em relação aos sentimentos de verdade.
Não sei bem
como tudo começou, dizem, incluso, que eu comecei por ser dos azuis. Não me
lembro, sinceramente e com todo o respeito. Como um menino do norte, vira
Benfica?
Lembro-me de
começar a ligar ao futebol, mas sem grande interesse, por volta do ano de 1990,
já benfiquista. Lembro de uma das melhores prendas que tive, foi do meu
padrinho, um portista convicto. Uma bola de futebol do Benfica, das de “capão”,
comprada nos quiosques, numa altura em que uma bola de futebol era algo
precioso e não havia por aí ao desbarato. Com essa bola joguei uns seis anos,
tentando, inutilmente, recriar na rua os lances de João Pinto, Rui Costa, Rui
Águas, Vítor Paneira, Isaías, Veloso, Neno, Mozer entre tantos outros.
Lembro-me que a
paixão definitiva, o casamento inseparável, deu-se após o primeiro jogo que vi
ao vivo. Um Vitória de Guimarães-Benfica. Daqueles jogos que se viam de pé, de
tão cheio que o estádio estava. Foi na época de 1993/94, em que nos sagramos
campeões. Vi pela primeira vez o Benfica ao vivo. Quando o Benfica marcou o
primeiro golo, soube desde logo porque o Benfica não é de Lisboa, é de
Portugal! Em Guimarães, o estádio todo a vibrar e a gritar golo! Sim, em
Guimarães! Desse jogo tenho vagas imagens, uma bem clara, do golo do Ailton de
cabeça, de fora-da-área. E desse jogo fica também a bandeira que o meu pai me
comprou no fim, a bandeira mais linda que vi até hoje! É curioso, antes dessa
época poucas imagens tenho de seguir o futebol, mas essa época foi como que um
nascer impetuoso de algo que ainda hoje vive e mim.
Desde essa
altura sempre que posso vou aos estádios, de há uns anos para cá, apenas ao
estádio da Luz. Outra sensação inexplicável, ver o Benfica no seu estádio! Não
em casa, porque a casa do Benfica é Portugal. Ali somos todos família.
Em termos de
futebol, cresci a gostar do Benfica, a interessar-me pelo Benfica, sem destilar
ódio a ninguém. Por isso tenho dificuldade em entender, não em aceitar, o ser
anti qualquer coisa. Eu vivo o meu clube, o não perco tempo a ver jogos dos
outros. Rivalidades? Sim, isso sim, são a chama do desporto, só se melhora
tendo bons rivais. Mas não mais que isso.
O ano passado
vivemos uma época estranha, faltou muito pouco, mesmo muito (um jogo em cada
competição) para termos a época de sonho. Não foi isso que me fez acreditar
menos na minha equipa, nos meus jogadores e no meu treinador. O que vivi
durante toda a época nenhum benfiquista da minha geração viveu. Foi de longe a
melhor época que vi o Glorioso a fazer, a par da de 93/94. Fui pela renovação
de Jorge Jesus e nunca o escondi. Tínhamos dois exemplos parecidos, o do
Sporting quando despediu o Peseiro e foi o que se viu e o do Bayern, perdedor
absoluto há duas épocas e que manteve toda a estrutura, saindo total vencedor
na época passada (com o nosso treinador do jogo de Vigo. Era péssimo, não era?).
Mesmo sendo um
corpo estranho no mundo benfiquista, mantive a minha posição. Se bem que a
certa altura, no início da época, cheguei a reflectir se não estaria errado.
Como podemos pedir estabilidade, dizer que queremos um Ferguson no Benfica, quando
nos aparece alguém que dá estabilidade à equipa (quatro anos, um primeiro
lugar, três segundos, dois dos quais a curta distância, quartos-de-final da
champions, quartos-de final, meia-final e final da Liga Europa) e, devido a uma
arrogância sem sentido (o passado não joga), queremos mandá-lo embora! Eu não
tenho memória curta e em quase 30 anos foram mais os anos a terminar o
campeonato em Dezembro (muitas vezes em 3º e mesmo em 6º) e a não avançar das
primeiras eliminatórias da Taça Uefa (sim, não da Champions) do que a lutar até
ao fim. Tenho consciência que as coisas custam a mudar. E só quem não quer ver
ou quem não quer que o Benfica melhore pode dizer uma coisa dessas.
O Jesus não é
perfeito, é arrogante, certas vezes de forma estúpida, mas isso grande parte
dos grandes treinadores o são. Ferguson, Mourinho, Capello, Bella Guttman,
Klopp são e eram arrogantes, porque são e eram bons no que fazem e faziam. Mas
eu acredito que o futuro do Benfica passa por ele. Mesmo sem ter muitos
títulos, já deu mais ao Benfica do que muitos (benfiquistas incluídos) pensam.
Recuperar um
gigante das cinzas, um clube que esteve quase a ir à falência, é algo ao
alcance de muito poucos. É muito mais difícil do que chegar a um clube vencedor
e desatar a ganhar coisas. Alguém imagina o Eusébio campeão da Europa com
equipas como as que tivemos no final da década de 90? Foi Rei, mas não jogava
sozinho, nasceu e cresceu numa equipa que já era campeã da Europa! Em que não
vinham os tubarões de fora buscar os melhores jogadores! Por isso falar é muito
fácil, invocar os heróis de antigamente quando éramos enormes! Para mim, os
grandes de outrora têm que ser o exemplo a seguir, mas não mais que isso. A
eles o enorme obrigado e reconhecimento por terem dado ao Benfica o estatuto
que goza hoje em dia, mesmo depois de passar por graves crises.
Ao escrever
isto não tenho certezas de nada quanto a esta época, pode ser boa, fenomenal ou
outro desastre. Só sei que quase no fim e ainda vamos por todas! E ao ver a
equipa jogar, estou convencido que seremos campeões! Mas isso já estava na
primeira jornada!