A completar vinte e oito anos de prática marcial e
fazendo uma retrospetiva de todas as experiências que o Karate me proporcionou,
devo reconhecer que muito do que sou devo-o a tudo o que absorvi do que me foi
transmitido, em grande parte pelo Sensei Marinho.
Tenho-me como alguém de rígidos princípios morais
(não confundam com religiosos), em que a distinção entre o bem e o mal, o certo
e o errado, sempre imperaram desde cedo na minha atuação no dia-a-dia. Com isto, ando
longe de dizer que não erro ou que não possa fazer o mal, mas sei que quando
isso acontecer será de forma inadvertida ou pensando que estou a tomar a melhor
decisão.
E no fundo é isto, acima de tudo, o que me desafio a
passar às crianças que nos são confiadas pelos pais para iniciarem connosco a prática
do Karate. Talvez o maior dos desafios, sendo que a melhor forma de ensinar é
pelo exemplo. E eu sei que o que eu sou, os meus alunos terão tendência a
imitar de forma aumentada.
Vivendo num mundo tão competitivo, das mínimas coisas
às maiores, tendemos a criar crianças que não têm tempo de o ser, tornando-se
ansiosas, nervosas e falsamente seguras que se derrubam à mínima contrariedade,
ou pequenos ditadores, desrespeitadores com a autoridade (seja ela qual for) ou
com os colegas, que pensam que tudo gira à sua volta.
Pela minha experiência, alguma como praticante, curta
como instrutor, qualquer uma destas vítimas da sociedade tem lugar nesta arte
marcial (e noutras). E sim, digo vítimas porque a uma criança pouco ou nada
pode ser imputado, pois são o que foram ensinadas/formatadas a ser.
Este sim, a meu ver, é o grande papel seja do Karate
ou de qualquer outra atividade desportiva. A vertente de atividade física, que
não deve nunca ser descurada, é a nossa melhor ferramenta para transmitir tudo
o resto. Só há uma coisa que me dá mais gozo que ver um aluno nosso a dar os
primeiros passos marciais ou a receber um prémio numa prova desportiva, ver que
o faz de maneira superior, com disciplina, com respeito pelos
colegas/adversários, pelo Sensei, pelos árbitros ou pelos pais. Se assim não
for, qualquer medalha será de latão por muito ouro que reluza ou qualquer cinto
apenas servirá de adorno, independentemente da sua cor.
Em poucos anos como instrutor, já com um largo número
de crianças que passaram pelas minhas mãos, retirei delas a maior das
aprendizagens…mais do que criar campeões numa sociedade cheia deles, preocupa-me sim
formar crianças com valores, numa sociedade vazia deles.
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