Passou um mês e meio desde a entrada desta famigerada
pandemia no nosso país, tomando conta das nossas vidas e da nossa liberdade.
Portugal viu-se obrigado a mudar, fecharam
restaurantes, cinemas, shoppings…fecharam cabeleireiros(as), esteticistas, lojas
de vestuário…fecharam-se as pessoas em casa.
E tudo o que não fechou teve que, muito rapidamente,
se readaptar às novas (grandes) exigências.
A face mais visível serão sempre todos os profissionais
que trabalham 24h sobre 24h nos nossos hospitais, soldados finais no combate
entre a vida e a morte, a quem rendo o meu devido agradecimento. As chamadas “linhas da frente”.
Permitam-me, podendo sempre ser contrariado, rejeitar
esta ideia de linhas da frente e linhas de retaguarda. O objetivo máximo passa
por evitarmos ao máximo a lotação dos ventiladores e dos profissionais que os
sabem manusear. E isso é papel de todos nós.
Por isso as linhas da frente são…
Todas as pessoas que se encontram em isolamento em
casa, que cumprem com todos os cuidados recomendados, sendo eles próprios
agentes de saúde pública.
Todas as forças de segurança, imperativas no controlo
eficaz de quem não cumpre e na sensibilização da população.
Todas as instituições de cariz social, nomeadamente
os lares, que longe de estarem preparados para algo assim (se nem hospitais
estavam) têm, a meu ver, papel primordial em atrasar/evitar a lotação do SNS. É
lá que sem encontra a maior parte de pessoas de risco elevado. E apesar de
tudo, de alguns percalços e atitudes pascais inconcebíveis, têm feito um
trabalho de mérito.
Todos os hospitais e unidades da RNCCI que não são de
acolhimentos de casos de COVID-19, mas que continuam a ter fluxo de doentes.
Muitas vezes, o maior perigo é aquele que não se vê ou que não se espera. E
sabemos que pessoas infetadas podem não ter escrito na testa “COVID-19”.
Eu, que trabalho numa unidade da RNCCI, acabo de ser
rendido, juntamente com outros valorosos colegas, após dias consecutivos de
labor intenso. E a intensidade, entenda-se, não é só a física. O ponto de
exaustão deve-se à junção do esforço físico com o desgaste emocional acrescido.
O medo…medo de, apesar de todos os cuidados, sermos porta de entrada para o vírus.
Porque lidando de perto com pessoas, na sua maioria debilitadas, não posso ter
a arrogância de pensar que nada tenho e que não posso falhar. Penso e repenso
todos os meus passos e intervenções, por mim, por eles, pelos colegas e pelos
meus. Contrariando esse medo, a vontade de continuar a cuidar de quem precisa,
mesmo que atualmente tenhamos que assumir que cada um pode ser um possível
infetado. Mas mais que isso, continuam a ser pessoas.
Como disse, acabo estes dias exausto, mas com um
sentimento de dever cumprido. Palavra a toda a equipa que agora sai comigo…fomos
e somos capazes. Aos que entram (que são minha equipa, mas apenas separados
pelas circunstâncias) …tenho toda a confiança em vocês e no que vão fazer. A
todos, é um orgulho crescer enquanto pessoa e profissional no vosso meio.
São vocês que me fazem ver a luz ao fundo do túnel.
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