Meu caro ano de 2018, peço-te desculpa pelo que vou
afirmar, mas não há forma de dizer que foste um bom ano. Entre as coisas boas e
as más, o peso destas últimas foi demasiado grande para poder ser de outra
maneira.
Começaste cinzento, muito cinzento, com algo que te
marcou pelo resto do tempo…ainda marca e continuará a marcar.
Há vários tipos de despedidas…as do dia-a-dia, às
pessoas com quem lidamos diariamente, aquelas a que, porventura, menos
importância damos. Há as despedidas de pessoas que sabemos que só voltaremos a
ver daqui a muito tempo, daquelas cheias de saudosismo. E há aquelas
despedidas, a que mais damos valor, um doloroso valor, que são para sempre.
E é nestes momentos que nos apercebemos da
importância dos “até amanhã” ou dos “até logo” que dizemos a diário, quase sem
os sentirmos, com uma displicência que a (falsa) certeza que temos de os voltar
a dizer nos dá.
Ficas marcado, indubitavelmente, por me teres levado uma
das pessoas mais importantes, daquelas com quem mais cresci, que mais ajudou a
forjar o meu carácter e a quem muito devo. Só não fico chateado, porque creio
ter sabido, ao longo dos anos, demonstrar todo o respeito, afeto e gratidão que
tive e terei sempre pelo meu Mestre.
Foi um ano em que concluí mais um desafio no âmbito
profissional, talvez aquele mais desafiador e difícil, mas ao mesmo tempo
cativante. Além dos colegas de curso, conheci profissionais que me orientaram
de uma maneira que apenas tenho que agradecer. Excelentes enfermeiros, que me
dão a certeza que a luta que travamos é mais que justa. Quer os meus
orientadores, quer os colegas dos serviços por onde passei, receberam-me como
se fosse mais um da equipa, algo fundamental para levar a bom porto e com a
motivação em alta este percurso.
Com estas duas experiências cresci, uma fez-me
crescer pessoalmente, ao ter que levantar a cabeça rapidamente para dar
continuidade a uma obra que não pode parar. Com a outra cresci
profissionalmente, realçando-me a importância da qualidade de vida que podemos
dar aos anos em que vivemos.
De resto, continuo a fazer o que gosto e quero junto
dos meus doentes, contínuo a tentar dar um pouco de mim às crianças que me são
confiadas, tudo isto no calor da família e dos amigos.
Para o Novo Ano, não posso pedir muito mais, pois já
passei muito tempo privado do que hoje faz parte do meu quotidiano. Que assim
continue e que daqui a um ano possa ter as pessoas que me são próximas junto a
mim.
A todos os meus familiares, a todos os meus amigos, a
todos os meus colegas, a todos os meus alunos e companheiros na Arte, desejo
que tenham a capacidade de ir atrás e de cumprir os vossos sonhos. Se não
estamos bem, a mudança que precisamos fazer está em nós, nunca no acaso da vida
e nos outros. Temos que assumir a responsabilidade pela nossa felicidade, dar oportunidade
e fazer com que ela aconteça.
A todos vós, obrigado por me acompanharem nesta
aventura que é a vida e um Feliz Ano de 2019!
Esta semana parecia ficar marcada pelos ataques cada
vez mais cerrados duma ministra sem escrúpulos, mentirosa e manipuladora, refugiada
numa comunicação social alarmista, sensacionalista e pouco preocupada com os factos.
Porém, aconteceram duas situações daquelas que, de
tão injustas, deviam de estar proibidas de acontecer.
Começo pela queda do helicóptero no dia de ontem.
Preparava-me para sair de casa quando começaram as notícias sobre o
desaparecimento da aeronave. Tive logo um mau pressentimento, que mais tarde
viria a confirmar.
Acidentes acontecem todos os dias, ninguém está livre
deles, mas acontecer a quem está em serviço, serviço que consiste em salvar
vidas…não se faz. Toda a tripulação morreu em prol dos outros, como se fossem
anjos em asas.
Daniela, não te conhecia, nunca tinha ouvido falar de
ti, tal como muitos outros colegas que hoje choram a tua partida. Mas sei que
és das nossas, não tenho a menor dúvida. Se há quem nos apelide de criminosos,
apenas te deixo com um sincero e singelo “obrigado” por tudo, um tudo que são
poucos a saber a sua verdadeira dimensão.
Sou enfermeiro e adoro o que faço. E se há algo que
me deixa completamente realizado é ver a recuperação dos doentes. É para isso
que lá estamos, mas nem sempre é possível.
Há umas semanas atrás o “Sr. J” abandonou o serviço
após um período connosco. Saiu bem, pelo próprio pé, um senhor muito diferente daquele
que tinha chegado até nós. Apesar do pensamento algo confuso que o acompanhava
diariamente (como me fazia rir com aquela necessidade de adquirir sempre mais
um determinado objeto), era um homem de bom coração, sempre com uma palavra de
apreço, que me disse um dos “eu confio em si” mais sentidos que ouvi até hoje.
Saiu do serviço com uma promessa, que iria ver se o
seu grupo onde tocava estava operacional e que iria vir à nossa festa de Natal
para participar nela. Caso não estivesse a funcionar, viria ele na mesma.
Ainda me lembro do sorriso com que nos deixou naquele dia e com a pele de
galinha com que fiquei, característica minha nestas despedidas.
Quando me vieram falar do “Sr. J” esta semana, pensei
que me iriam dizer “Ele vem à festa”…mas em vez disso, apanhei um murro no
estômago. Sei que ficou impossibilitado de cumprir a sua promessa, que acredito
que cumpriria. Nesse momento, e ainda inebriado pela violência do choque,
revivi muitos dos momentos em que, durante um mês, trabalhei, convivi,
chateei-me, sorri ou ouvi o “Sr. J”.
Com a devida distância profissional, considero que
apenas conseguimos chegar aos doentes com afeto, sendo ele expresso das mais
diversas maneiras. Por isso, estas partidas inesperadas sempre me abalaram um
pouco, fico mais pobre com cada uma delas. Talvez seja por isso que me considerem uma pessoa cruel, um criminoso, talvez dos da pior espécie. Mas voltaria a cometer os mesmos crimes que tenho cometido, principalmente o de me ter tornado enfermeiro.
14 anos, 14 longos anos…não imaginas o esforço que
faço para manter viva a tua presença.
A imagem é-me mantida pelas inúmeras fotos, desde
tenra avó até que te tornaste na mais sapiente delas todas. O que sempre foste,
com ou sem experiência, foi atenciosa, carinhosa, uma cuidadora cuidadosa,
devotada à família.
Da tua voz vou perdendo o som, tentando lembrar
conversas longínquas que parece que tivemos ontem.
Do teu calor e do teu cheiro já não tenho ideia, bem
tento, mas não recordo. Maldita memória que me atraiçoa.
O que não esqueço é o sentimento de segurança e de
paz que me davas. Quando pequeno, o teu colo era porto de conforto, quando já
crescido eras a voz da experiência cuja presença me tranquilizava.
Sei que não eras perfeita, mas na tua imperfeição
foste a avó perfeita. É em ti, na tua maneira de ser, que baseio a forma em
como cuido dos outros. Não me viste a tornar-me enfermeiro, na altura em que
partiste ainda era um projeto muito fraquinho e inseguro do que seria. Das últimas
imagens que tenho, eram as minhas visitas ao hospital para te ver em que tu
dizias às tuas vizinhas de quarto que eu era enfermeiro…e eu cheio de medo em
que alguma das enfermeiras te ouvisse! Já me questionaram o porquê de ter
escolhido este caminho, ao que respondo que desde cedo tive essa ideia. Agora o
porquê de a ter, cada vez mais tenho a certeza que foi por tua causa.
Estranha vida esta, quando precisaste não estava
preparado para cuidar, agora que me sinto capaz já cá não estás. Acredito que
fosses gostar no enfermeiro em que me tornei, pelo menos assim gosto de pensar.
Saudades são muitas, talvez a única coisa que me
fizesse querer voltar atrás no tempo seria sentar-me uma última vez no teu
colo, eu pequeno num dos lugares mais seguros do mundo.
Lamentavelmente a tragédia bateu à porta duma família
em Sabrosa, família esta que vivia com poucas condições segundo se consta.
O que aconteceu, infelizmente, tem ocorrido
pontualmente a pessoas de melhor ou pior condição social.
De repente, lê-se e ouve-se muita indignação nas
redes sociais (grande lugar para os opinadores de sofá) e nos jornais
televisivos (em que o que interessa é aparecer, independentemente do que se
diga).
Ouvi dizer que esta família era humilde, de gente
trabalhadora, pronto, que bebia um bocado, mas que não foi por aí. Sai uma
multidão, que até ontem devia de pensar que estas situações não existem, a
reclamar casas para as pessoas que precisam.
Multidão esta que é a mesma que reclama contra o RSI,
que reclama contra as ajudas socias de quem menos tem, que se alguma entidade
ligada ao Estado desse uma casa a uma família carenciada seriam os primeiros a
gritar a injustiça que seria uns terem que trabalhar para ter uma casa e outos
não. A hipocrisia (só se vê quando se quer) e a bipolaridade (analisa-se as situações
conforme o que interessa no momento) são duas caraterísticas muito portuguesas,
não são apenas qualidades.
Bato na mesma tecla há muito tempo, somos, cada vez
mais, um país de terceiro mundo com aparência de primeiro. No parecer,
parecemos muito. Não há crianças e/ou adultos sem telemóvel, sem carro, sem
roupas de marca, sem casa própria, tudo se consegue com aparente facilidade.
Até os pais que se matam a trabalhar por dar luxos aos filhos acreditam na
normalidade da situação.
Mas por trás desta fachada há um outro Portugal, um
país de miséria de início do século XX, em que noções básicas de higiene, saúde
ou condições habitacionais mínimas diferem um pouco do que a maioria de nós
tem.
E estes casos existem à vista de toda a gente, todos
nós sabemos de alguém que vive abaixo do que consideramos digno. E todos
assobiamos para o lado, como se fossem invisíveis aos nossos olhos.
Estas situações deviam ser sinalizadas pelas entidades
que mais perto delas vivem, que atuam no terreno. Não vou acusar ninguém,
porque não sei quais as condições que o país dá aos profissionais responsáveis
por estes casos para os resolver. Sou, isso sim, da opinião que, mesmo o país
não dando condições para tal, se deva sinalizar os casos. O que não se deve
fazer é saber-se das situações e nada se fazer, apenas porque nada se poderá
solucionar.
A nível profissional são muitos os casos que nos
passam pelas mãos, famílias idênticas às de Sabrosa, que de repente deixaram de
ter condições para regressar ao domicílio, domicílio que até ao momento tinha
servido. Aproveita-se a institucionalização das pessoas para que os serviços de
saúde resolvam os problemas sociais da população. Além de se tratar e cuidar de
um doente, as equipas lutam para proporcionar soluções sociais a estas pessoas.
Depois temos as camas hospitalares e da RNCCI com pessoas saudáveis que não têm
lugar para onde ir, e doentes que não têm uma cama para se deitar.
Depois é a velha máxima que utilizo, cada caso é um
caso. Há pessoas que tiveram azar no meio em que nasceram, mas construíram a
sua sorte, há outras que tiveram sorte no seio familiar e foram em busca do
azar. E há as que nunca souberam sair do azar em que nasceram. Simplesmente nem
todo o azarado é coitadinho.
Um conselho se me permitem. Quando acharem que há
alguém que conhecem em risco social, comuniquem-no nos devidos sítios, de modo
que as entidades competentes possam atuar.
O que aconteceu em Sabrosa é triste e poderia ter sido
evitável, mas não sou ninguém nem conhecedor dos dados para poder dizer que a
tragédia tem ou não a ver com a situação social da família. Tudo que pudesse
dizer nesse sentido seria especulativo e sensacionalista.
O dia marcado para nos lembrarmos dos entes queridos
que já cá não estão, recorda-me sempre a importância de passar o tempo com os
que cá estão.
A vida é uma correria, as 24h diárias
cada vez são mais curtas para se fazer tudo o que se quer (não confundir com o
que se precisa fazer). As nossas exigências pessoais são cada vez maiores,
queremos mais luxos, queremos uma casa melhor, um carro melhor, uma televisão
melhor, o colégio para os filhos, milhentas atividades em que eles têm que ser
os melhores dos melhores…esquecendo-nos de aproveitar os simples prazeres da
vida.
Às vezes considero-me alguém pouco ambicioso, apesar
de procurar fazer o melhor possível em todas as facetas da minha vida. Dou
valor às pessoas e aos momentos que passo com elas. Esse é o motivo maior que
me faz acordar todos os dias com vontade de enfrentá-los.
No trabalho, colegas e doentes, a maior lição sobre
relações humanas. No Karate, amizades de toda uma vida e alunos que me desafiam
diariamente. No seio familiar, a segurança e intimidade no seu expoente máximo.
Nas minhas amizades, o carinho, a confiança, pessoas a quem devo muito do meu
crescimento pessoal.
É o tempo que passo com eles todos que faz valer a
pena. Mais do que os sítios onde vou de férias ou onde vou jantar, importa-me
mais com quem o faço.
Como já disse, o tempo é curto, não precisa que o
encurtemos mais. Às vezes custa, custa horas de sono a menos, mas se o faço é
por dar valor às pessoas que me fazem trocar o descanso pelo prazer da sua
companhia.
As pessoas que infelizmente já não tenho comigo…mal
seria lembrar-me delas apenas hoje. Foram parte importante do meu passado e
continuam comigo, levando-as a todas as pessoas com quem contato. Fui, sou e
serei um prolongamento de tudo o que me transmitiram.
O que me deixa leve, de consciência tranquila, é o
fato de ter aproveitado o tempo com essas pessoas ao máximo. Nem sempre passei
todo aquele que queria, mas os momentos juntos foram passados de corpo e alma
presentes.
"Don’t you cry for the lost
Smile for the living
Get what you need and give what you’re given
Life’s for the living so live it
Or you’re better off dead"
Estava a pensar escrever a minha opinião sobre o
study case do escândalo CR7 ou das praxes criminosas, até que ontem fui
assistir a um filme.
Como fã de cinema, ando mais ou menos por dentro das
estreias ou dos grandes filmes que estão a chegar. Não foi o caso de ontem, um
filme desconhecido, que nunca ouvira falar, lançado em Fevereiro de 2017 e, não
sei porquê, parecia perdido (ou destinado?) ao esquecimento.
Surpresa das surpresas, saltou para o meu top 3 de
filmes preferidos, ficando com o último lugar do pódio. Destronar “A Vida é
Bela” ou “Dois é família” não é coisa fácil.
O que têm estes filmes em comum? Todos eles abordam
situações dramáticas, mas com a qualidade que eu mais admiro no mundo, o humor.
O “The Healer” fala do dom de curar pessoas, sob a
metáfora dum “curandeiro”. Que tem este filme de tão especial para me tocar
desta maneira?
Por muito desesperante que seja uma situação, por
muito que não se veja a luz ao fundo do túnel, cabe-nos a nós, simples cidadãos,
transformar o mundo de quem passa por uma situação dessas.
Associamos o termo “curar” à condição de alguém ficar
são, normalmente de algum mal físico. Porém, às vezes isso não é possível. Baixamos
então os braços e deixamos simplesmente as coisas seguirem o seu rumo?
Curar a alma é, quem sabe, a tarefa mais difícil e
mais importante quando a morte é algo cada vez mais palpável. Seja para uma
possível recuperação, seja para um fim digno.
Ontem, ao assistir ao filme, sorri, daqueles sorrisos
carregados de compreensão, às vezes acompanhados com uma lágrima (não foi o
caso vá), recordando-me de algumas pessoas que tive o privilégio de conhecer e
acompanhar enquanto enfermeiro. Pessoas de quem cuidei, pessoas que fiz rir e
sorrir, pessoas que muito me ensinaram, sendo que a maioria já não se encontra
entre nós. Anónimos de nome, mas cujas caras para sempre lembrarei. Não as
consegui curar, foram elas que me foram curando.
Aconselho vivamente o filme, podem sair do cinema a
sorrir ou a chorar, mas indubitavelmente mais enriquecidos enquanto pessoas.
Tudo o que eu sou devo à minha família,
principalmente aos meus pais, que sempre tentaram orientar-me pelos caminhos
que sentiam ser os melhores para mim. Foi assim que, nos finais de 1991,
tiveram a sabedoria e a sorte de me levar a experimentar o Karate e a entrar na
AKFAFE…ou talvez fosse apenas algo que tinha mesmo que ser. E mais do que me
permitirem iniciar esta arte, foi graças ao apoio que sempre senti que fui
permanecendo nela, mesmo quando o cansaço e as dúvidas apareceram.
Posso dizer, talvez sem exagerar, que passa do milhar
o número de pessoas com quem partilhei treino a nível local, e são já uns
milhares as que conheci durante toda a minha prática.
Inicialmente com o objetivo de ser uma atividade
desportiva, descobri no Karate uma Arte Marcial cujo maior valor são os valores
que transmite. Com toda a certeza, esses foram a minha maior medalha em toda a
minha prática, que me fazem ter um sentimento de dívida eterna com esta arte.
Recebi e continuo a receber tanto, que a minha ilusão aumenta a cada ano que
passa, ainda mais do que no dia em que a iniciei.
Hoje não treino tendo em vista a conquista de pódios.
Treino apenas para superar-me a mim mesmo e para conseguir ser exemplo para os
mais novos, tentando ser veículo de transmissão dos ensinamentos que me foram passados estes anos todos e continuam a ser passados. Desafio muito maior do que a busca de medalhas.
Como sabe bem ver a energia contagiante de quem nos chega, sem nada saber, mas com enorme vontade de aprender. Ver o crescimento brutal, a todos os níveis, das nossas crianças, sempre na esperança que venham a ser pessoas de bem e que acrescentem algo de bom à sociedade. Esse é o nosso grande trabalho. Com a sociedade que temos, com uma falta gritante de
valores, em que tudo é competição, em que tudo é inveja, em que tudo se quer de
bandeja, creio que o Karate poderá dar um pequeno contributo para um mundo
melhor.
O caminho, neste momento, está a ser feito ainda de coração
pesado. O Sensei Marinho será sempre o meu exemplo, a pessoa em quem me
inspirarei para inspirar os outros. Com ele cresci a aprender que antes de
merecer o que seja, tinha que fazer algo por isso. Aprendi a não exigir nada, a
saber esperar o meu tempo, a confiar no meu trabalho e a saber que o seu
reconhecimento vem com o tempo, sem necessidade de me por em bicos de pés ou de
bradar aos céus. Aprendi que a confiança se ganha com lealdade, com
honestidade, com atitudes. E isso não acontece em poucos anos.
Mas o caminho faz-se caminhando, lado a lado com pessoas
de máxima confiança (aquelas que talvez melhor me conhecem), com enorme vontade
e com um sentimento de união que se consegue apenas no seio de uma família.
Hoy vuelvo
a arriesgarme a escribir de nuevo en castellano, después de casi tres años sin
hacerlo.
Hace días
regresé a la ciudad que ,con el pasar de los años, se ha tornado una segunda
casa. Es la segunda vez que regreso a Pontevedra como turista. Y la verdad es
que los ojos con que miran los turistas los sitios son distintos de los ojos de
las personas que los habitan.
Una
persona me ha comentado que las ciudades son como las parejas, que nos
acostumbramos a sus calidades, y estas se tornan invisibles a nuestros ojos.
Pero están allá.
Mi
relación con Pontevedra empezó de la misma manera con que me relaciono con los
locales donde no quería estar. Fue difícil, no me gustó, solo veía lo malo, o
mejor…no conseguía ver lo mejor que la ciudad tenia para ofrecerme.
Despacito,
descubrí encantos escondidos, que estaban delante de mí. Empiezo por lo que más
me gusta…las tapas. En Portugal se come muy, muy bien, pero allá, un modo
distinto de comidas, también lo conseguimos hacer. Echo de menos tapear en una
mesa llena de amigos, en una terraza en pleno verano. Las tapas en Portugal no
saben a lo mismo que en España, lo siento.
Sigo para
el centro histórico. Tal y cual como la ciudad, no es muy grande, pero muy
acogedor, con todo muy cerca. Por las noches de viernes y sábados se llena de
vida y colores, con los bares típicos de puerta en puerta.
Las
fiestas…debo admitir que el pueblo gallego se divierte como nadie. Las fiestas
de la ciudad, que se prolongan por más de una semana. La noche de los piratas
entre otras. Y la principal, la Feria Franca, en que toda la gente vuelve a los
tiempos medievales, de los caballeros, duques, damas, princesas y cruzados, con
trajes de hacer envidia.
Hablo de
seguida de las playas, las que serían las mejores del mundo si el tiempo fuera
más estable y el agua más calentita. Locales escondidos del turismo voraz,
salvajes, puntos de unión entre los montes y el mar. Aguas tranquilas, teñidas
de un azul cristalino, que nos hacen acordar el paraíso. Y todo esto aquí tan
cerca.
Termino
con lo más importante que tenemos en nuestras vidas, independientemente de
donde estemos…las personas. Si me enamoré de Pontevedra, lo debo a toda la
gente que conocí, con quien viví, con quien trabajé o con quien fui de fiesta.
Los abrazos y las sonrisas con que soy recibido, lo atropello de preguntas
sobre cómo me va la vida (no por cotillear) o el sincero “vuelves?” me hacen
ver que dejé mi huella en el corazón de las personas…así como dejaron en el mío.
Como dije
a mi jefa, la llamada que le hice hace tres años a decirle que me marchaba ha sido la más difícil
que tuve que hacer en mi vida. La voz embargada, el temblor de las manos, el
frio en la barriga eran señal que me preparaba para marchar con toda la ilusión
del mundo, pero con un peso en el corazón por toda la gente, por todos los
sitios, por todas las experiencias que me hicieron crecer en Pontevedra.
Já muito escrevi sobre nós, sobre ti, mas estar
contigo relembra-me sempre o porquê de o fazer.
Está quase a fazer 16 anos desde que nos conhecemos e
pode-se dizer que foi uma amizade à primeira vista. Como qualquer outra, ela
teve que ser construída, pedaço a pedaço até chegar ao que é hoje em dia...deixando de ser como qualquer outra.
Vivemos intensamente (intensidade à nossa maneira) os
ditos melhores anos da nossa vida, apesar de eu acreditar que o melhor está
sempre por vir. Mas algo de verdade tem essa ideia, pois Viana será sempre a
origem das nossas raízes.
Fizemo-nos à vida, vida essa que nos levou para longe
um do outro. Porém, cada reencontro é sentido com a cumplicidade de quem se vê
todos os dias e com a saudade que demasiados quilómetros acalentam.
A tua amizade é uma terapia para mim (não vale cobrar
consulta), das fortes amizades que tenho foi aquela que mais me permitiu
crescer no que ao ser amigo diz respeito. Começou em Viana, deambula entre
Barcelona, Pontevedra, Venade, Fafe…em qualquer lugar que nos permita largas
conversas e altas gargalhadas. E como sorrio ao saber-te feliz...e mais careca!
O segredo de tal afinidade…será só um? Começo pelo
que me parece mais importante, o respeito, enorme respeito, que sempre tivemos
pelas nossas divergências. Só assim, a tua opinião teve o peso que teve (e tem)
em algumas decisões que tomei, mesmo quando iam contra o meu modo de pensar.
Depois acho que temos uma amizade especial devido à
absurda simplicidade que ela acarreta. Apesar dos anos terem passado, de nos
termos tornado adultos, ainda vejo em nós muito dos dois miúdos que se
conheceram com 18 anos.
Numa sociedade cada vez mais com os valores ausentes
ou invertidos, és tu, muitas vezes, que me fazes ver que não remo sozinho
contra a maré. E assim, caminhando pela vida, nesta encruzilhada de rumo
incerto, seguimos juntos apesar da distância que nos separa.
Gostaria de começar este texto a dizer que não nasci
para ser enfermeiro. Cresci sem saber ao certo o que queria ser quando fosse
grande…jogador da bola como toda a gente; bombeiro ao ter o quartel a dois
passos de casa, sendo local de visitas e brincadeiras frequentes; Jedi, o
verdadeiro herói das galáxias, quando a fantasia reinava no meu pensamento;
professor de educação física (talvez a profissão mais próxima do meu perfil e
preferências) …e não me lembro de muito mais.
Hoje em dia identifico-me em dois papéis, enfermeiro
e karateca (praticante e instrutor). Enquanto crescia, enquanto sonhava com
muitas coisas, tornei-me sem dar conta em karateca, não apenas dentro do dojo,
mas principalmente fora dele. Não pretendo falar neste texto sobre o que já
falei muito, mas esta Arte foi a base para a formação dos princípios e valores
que defendo, onde aprendi o verdadeiro valor da amizade e do “um por todos e
todos por um”.
Voltando-me agora para o papel de enfermeiro, este começou
a ganhar forma lá pelo 10º ano quando decidi que era o curso que queria, sem
fazer a mínima ideia do que era (é) ser enfermeiro. Uma ideia em bruto,
completamente em bruto.
Passo seguinte, deu-se com a entrada na universidade, onde me tornei vianense de adoção. Foram anos incríveis, onde conheci gente
para a vida, que ainda hoje considero como melhores amigos, pese a distância
que nos separa. Quanto à Enfermagem, não encontrei nestes anos a chama que me
fizesse sentir que estava no meu lugar, naquilo que queria ser. Sem culpar
ninguém, não tive nesse período um exemplo que me fizesse pensar “é este o
enfermeiro que quero ser”.
Até que chegou o quarto e último ano e tive três
orientadoras, todas com perfis diferentes, que me cativaram para ser
enfermeiro. Enf.ª Maria do Carmo, Enf.ª Carla e Enf.ª Isabel (esta, quem sabe,
a pessoa que num mês me marcou mais que qualquer outra nos anos anteriores,
aquela com quem mais cresci).
Termino o curso e estou um ano a percorrer o deserto,
em busca duma oportunidade em qualquer zona do país. Uns “biscates” na área não
chegavam para fazer-me sair do desânimo que crescia em mim. Pelo meio, uma
proposta que tive a gentileza de recusar, por serem dessas que nos fazem corar
de vergonha.
Até que recebi uma chamada do país vizinho, a
perguntarem-me se queria iniciar funções no dia seguinte. Não fui logo nesse
dia, fui uns dias depois. Por lá, pela minha Pontevedra, fiquei sete anos, anos
em que evoluí pessoal e profissionalmente e aprendi, aos poucos, a gostar e
abraçar a profissão que tinha escolhido. Num local de trabalho complicado, em
que muitas vezes não havia mãos a medir, ganhei capacidade de trabalho e sacrifício.
Com humildade, creio ter sabido absorver as aprendizagens que as minhas colegas
mais velhas me proporcionaram. E com muitas outras, algumas a iniciar este
caminho como eu, crescemos juntos, com apoio constante, limpando as “lágrimas”
nos momentos difíceis, sorrindo nas nossas muitas alegrias.
Aquela casa, aquela gente, sempre as levarei no meu
coração. Se sou enfermeiro, foi pela oportunidade que me deram, e acredito ter
pago a confiança com a minha dedicação durante os anos em que la estive.
Sete longos aos depois, quando já poucas esperanças
tinha, abriram-me de novo uma porta, aquela pela qual tanto ansiava. Estava de
regresso a casa.
Nesta nova etapa, mais uma vez, fui recebido de
braços abertos e abri-me ao conhecimento que os novos colegas me tinham para
dar. O Karate ensinou-me que a aprendizagem é para a vida e isso transfiro para
a minha profissão. De todos tenho algo a receber.
Num novo serviço, com um doente tipo bastante
diferente ao que estava habituado, renasci como enfermeiro. Mais do que o
conforto, mais do que o substituir as pessoas no que não podem fazer, mais do que as
técnicas e a medicação, mais do que o cuidar (que tanto gosto e é a base da
Enfermagem), descobri que o prazer maior é o de reabilitar. Foi algo que foi crescendo sem eu
dar conta, mas dá-me um gozo tremendo ver a qualidade de vida que se pode dar
às pessoas, sendo preciso tão pouco…as nossas mãos, a nossa vontade (muitas
vezes superior à dos doentes), o nosso saber e a nossa crença. Esta, talvez, a
mais importante, acreditar que a pessoa vai ficar melhor, mesmo que, ao receber
a pessoa ao nosso cuidado, muitas vezes não saibamos como será isso possível…mas
é.
Fez há uns dias dez anos em que posso dizer “sou
enfermeiro”. Digo-o com orgulho, não em mim, mas em toda a classe a que
pertenço. Por muitas dúvidas que nos assolem, por muito maltratados ou pouco
reconhecidos que sejamos (socialmente…ou politicamente), por muito que a esperança
se desvaneça…acreditem, são especiais.
Não vou aqui falar em todos os sacrifícios que a
nossa profissão acarreta, já falei muitas vezes. Apesar de saber que o meu país
nunca vai ter condições para me pagar o que acho justo, regressei porque quis e
não deixo de ir com um sorriso para o meu trabalho. Pelos meus colegas e pelos
meus doentes. Que me perdoem os meus colegas, mas principalmente por estes. É
por eles e para eles que lá estamos, a maioria dá-nos o valor que merecemos e
são reconhecidos. Embora não me alimente nem pague as contas com isso, a melhor
paga que tenho pelo meu trabalho são os “obrigados” e as lágrimas dos utentes
na hora da alta.
Já fiquei com pele de galinha e já me emocionei com
algumas despedidas. Porque, parafraseando alguém, somos gente que cuida de gente,
e ao tocarmos alguém estamos a deixar que nos toquem.
Não sei o que me reserva o futuro, desejo apenas que
a paixão e amor que sinto pelo que faço se mantenham.
“Mais importante que o destino, é o caminho
percorrido para lá chegar!”
Talvez seja esta a frase que melhor resume a
empreitada que eu e mais vinte e nove colegas iniciamos em Outubro, quando nos
candidatamos a ser Enfermeiros Especialistas em Reabilitação.
Passados dez meses de um processo de aprendizagem
intensivo, duro e de sacrifícios, estou longe de me sentir Especialista. Nunca
considerei que cursos ou cartões dessem direito às designações neles contidos.
Acima de tudo, é o dia-a-dia, é a experiência, é o pôr em prática os conhecimentos
que nos pode levar ao merecimento de tal designação.
Por isso não me considero especialista, sinto-me,
isso sim e ainda antes de iniciar este percurso, enfermeiro de reabilitação.
Foi o sentir que o que fazia para ajudar os meus doentes não era suficiente,
que podia fazer mais e melhor, que me fez entrar neste desafio.
Sempre o disse e acredito piamente nisso, só
evoluímos, seja pessoalmente ou profissionalmente, se sairmos da nossa zona de
conforto. O que vem fácil, vai fácil ou não tem valor.
E o que destaco destes meses todos, são as pessoas
que conheci, desde os meus colegas, aos professores e orientadores.
A primeira palavra, como não podia deixar de ser, é
para vocês meus caros colegas. Companheiros de sacrifícios, de estudo, de
trabalhos, de angústias…mas também de risos e sorrisos, de solidariedade, de
alegria. Apesar de ter sido voluntário involuntariamente, ser o vosso delegado
de turma foi um privilégio. Porque é que digo isto? Tentei conhecer todos, ser
um elo de ligação e de apoio para o que precisassem. Independentemente de haver
relações mais fortes que outras, de todos levo algo, cresci com cada um de
vocês. Parabéns e obrigado.
Sigo para os Professores, destacando a Professora Esperança, o Professor
Fernando e a Professora Manuela, que nos orientaram de
mais perto, mas nunca esquecendo todos os que nos deram o seu contributo.
Pessoas de com grande saber acumulado, mas acessíveis e disponíveis para nos
ajudarem.
As próximas palavras vão para todos os meus
orientadores de estágio, responsáveis máximos pela minha evolução, que pelo
exemplo foram e são modelos que pretendo seguir no meu percurso profissional.
Enf. Nuno e Enf.ª Fernanda (Gaia); Enf. Jorge
(Braga); Enf.ª Graça e Enf.ª Ana (Cabeceiras); Enf. Vasco e Enf. Aníbal (Póvoa
de Varzim)…estes sim, considero Enfermeiros Especialistas em Reabilitação.
Foram fonte de aprendizagem, de reflexão, de conselhos, deram-me motivação para
exercer ainda com mais vontade a nossa nobre profissão, encorajando-me a
assumir sem receio os desafios que a minha vida profissional me puser à frente.
A minha enorme gratidão para todos.
Não esqueço ainda todos os colegas que, apesar de não
estarem diretamente na minha orientação, colaboraram nela e fizeram-me sentir
membro integrante das equipas por onde passei.
Estas foram as pessoas que acompanharam de perto todo
o meu percurso formativo, mas houve outras que não podem ficar sem uma
referência.
Os primeiros, teriam que ser sempre eles, os meus
pais. Por me apoiarem desde o primeiro momento, pela preocupação e interesse
constante, pela compreensão nos momentos de maior impaciência resultantes das
diminutas horas de sono, por tudo.
Palavra maior também para todos os meus colegas do
trabalho, pela sobrecarga que a minha maior ausência do serviço provocou. O que
me levou a dar tudo foi também o não querer que o vosso esforço fosse em vão.
Se cheguei a bom porto, a vocês o devo. Isso nunca esquecerei.
Aos meus amigos, a esses, além do obrigado pelo apoio
incondicional, as minhas desculpas. Pelas ausências ou pelas presenças com a
cabeça noutro lugar.
Sónia Marinho e Márcio Carvalho, este meu percurso
coincidiu com a nossa época mais difícil. Ter o apoio dos dois foi fundamental
para poder desligar-me o possível do Karate quando assim me foi exigido.
Sabendo que tudo correria dentro da normalidade. Sempre AKFAFE.
Gratidão é palavra a que dou muita importância. Devido a ela estou em dívida com todos vocês.
Pode-se pensar que isto é o fim…mas não o sinto
assim. Para mim é apenas o começo de uma nova fase. Mudei, mudei a minha
maneira de ser, estar e ver a enfermagem. Mais importante que ser especialista,
é ser especial, será sempre esse o meu repto em tudo o que faça.
E não tenho dúvidas, as pessoas deste grupo têm tudo
para serem especiais…sejam felizes no que fazem e não se esqueçam, mais
importante que dar anos à vida…é dar vida aos anos.
Um sincero obrigado a todas as pessoas que, das mais
diversas formas, me felicitaram pelos meus 34 anos. Um especial para aqueles
que estiveram presentes, mas também para todas as mensagens daqueles que estão
presentes todos os dias mesmo estando longe.
Um ano mais velho, um ano de real crescimento. Sem
dúvida alguma, foi aquele em que mais cresci, pessoal e profissionalmente.
Sinto-me hoje, algo diferente de há um ano atrás.
Profissionalmente, encontro-me ainda no maior desafio
que me propus até hoje. Um desafio exigente, de quase exaustão, mas que,
acredito, está a dar-me as ferramentas (e pensamento) necessárias para ser melhor
enfermeiro. Uma aprendizagem da responsabilidade de muitas pessoas, a quem já
agradeci, mas fá-lo-ei mais personalizadamente mais à frente.
Pessoalmente, cresci e aprendi com uma das maiores
perdas da minha vida. Nem sempre é fácil levantar a cabeça ou seguir em frente,
mas há alturas em que não se pode parar. Descobri uma resiliência que
desconhecia, mas aprendi que a vida é curta para deixarmos para amanhã o que
deve ser feito hoje. Estar com quem devemos, dizer o que sentimos, dar o valor
às pessoas enquanto estão connosco. Só assim fará sentido o que se disser
depois.
Ambas as situações levaram à maior mudança em mim. A
minha visão, não a de ver apenas com os olhos, mas a de ver e sentir quem foi o
meu suporte quando mais precisei. Algumas boas surpresas…algumas revelações.
Por isso o meu tempo, aquilo que de mais precioso
tenho, passou a ser dado às pessoas que me fazem sentir bem, pretendido e
acarinhado. A elas, que sabem quem são, dou o meu mundo.
Para terminar, farei menção particular apenas a uma
mensagem que me enviaram. Já fora de horas (nunca o é), quando já me preparava
para dormir, chegaram-me as seguintes palavras (apenas um excerto da mensagem):
“Como
amigo, apenas quero que tenhas sempre em mente que a vida é mais curta do que
aquilo que parece, por isso devemos tirar o máximo partido de todos os momentos
que nos fazem viver cada dia da melhor forma. Não há homens de ferro, mas há
homens sinceros e honestos e que dizem mais quando não falam. Espero que não te foques
apenas em dar o exemplo, já o fazes inconscientemente. Sê tu mesmo e continua a
ser quem és.”
Um amigo, um rapaz que vi crescer, que se tornou um
homem e que neste momento é um exemplo para mim. Pelo coração que tem, pela
força que demonstra e pelos princípios pelos quais se rege. Se já ia dormir de coração
cheio, permitiste-me adormecer com um sorriso.
Muito se tem discutido sobre a eutanásia nos últimos
dias, temos ouvido e lido diversas opiniões de ambos os lados e todas me
merecem o devido respeito. O único senão é que não me parece que seja um tema
para tantas certezas, seja de que parte for.
Eu pelo menos não as tenho, consigo arranjar prós e
contras para qualquer uma delas.
Já vivi situações que me fariam concordar,
como também já passei pelas situações que me fariam pensar o contrário.
Acho que, acima de tudo, temos que contextualizar a
eutanásia e contextualizar o país em que estamos.
Primeiro, uma das ideias que me parece muito presente,
é que a eutanásia vem para “exterminar” as pessoas em fim de vida, sem
perspetivas de cura. Aqui entram em cena os que defendem (e muito, muito bem,
tal como eu defendo) os cuidados paliativos. Acredito piamente que com cuidados
paliativos de qualidade é possível proporcionar um fim de vida digno a quem vê
o seu tempo chegar ao fim devido a doença. Aqui entram em cena os que dizem que
há situações que não há assistência que valha a quem está em tal posição de
forma a mitigar o seu sofrimento. Não discuto, não sou especialista na área,
nem nunca trabalhei num serviço especializado em paliação.
O grande cerne da questão, nesta área, é a tal
contextualização do nosso país. Temos um país que permita a todas as pessoas em
fim de vida e em sofrimento ter acesso a este tipo de cuidados? Não, não temos.
Temos que lutar por isso? Claro que sim, acho fundamental a existência duma
rede de cuidados paliativos de qualidade que abranja todo o país, de modo a dar
resposta a todos os casos. Nova pergunta, alguma vez iremos chegar a esse
ponto? Não gosto de futurologia, penso que não, mas não o posso afirmar.
Contudo temos um problema, até que esse dia seja
palpável teremos muitas pessoas a falecer em sofrimento. Infelizmente, imagino
que haja muitos doentes a ter uma morte pouco digna por este país fora, seja em
situação de doença terminal ou aguda.
Já trabalhei num serviço (fora de Portugal) que não
era de paliativos, mas que recebíamos doentes em fim de vida. Alguns casos
conseguíamos dar uma resposta adequada, noutros não e quando tentávamos enviar
os doentes para um local mais apropriado eram-nos fechadas as portas. Diziam
que não havia camas ou não valia a pena, que os poucos recursos que tínhamos eram
suficientes…não o eram. Aprendi a lidar com dois tipos de morte, a digna e
aquela pela qual espero um dia não passar...reformulo, com esta não consegui aprender a aceitá-la.
Depois temos os outros casos, casos extremos que quem
fala em cuidados paliativos parece esquecer que existem. Os tais em que a
pessoa decide que não quer viver mais na situação em que se encontra, como são
os casos, só como exemplo, das tetraplegias. Aqui é que
esbarramos num muro de crenças que, a meu ver, deve-se deitar abaixo. Podem ser
até situações em que não haja sofrimento físico...mas todos sabemos que não
existe apenas esse. Eu, Jorge, pessoa autónoma, com família, amigos, trabalho
etc, digo neste momento que não quereria viver numa condição em que apenas
pudesse mexer a minha boca ou os meus olhos. Seria uma mente presa num corpo
morto. E são estes casos, acima de tudo, em que acho que apenas quem passa por
eles sabe verdadeiramente a agonia em que vive, que deviam de ter o direito a
ter outra opção. Porque quem sou eu para dizer que os meios existentes para
ajudar um tetraplégico são suficientes para acabar com o sofrimento em que
vive? Além que todos sabemos que pessoas nestas situações com os meios dum
Christopher Reeve ou dum Stephen Hawking são raras.
Quero deixar aqui a salvaguarda que ninguém com uma
depressão amorosa ou algo parecido se inclui nos critérios para a eutanásia. Um
dos argumentos que vejo a ser dado a favor é que o número de pedidos de pessoas
para morrer é cada vez maior. Calma, muita calma. Se assim fosse, talvez metade
das pessoas internadas em serviços de saúde seriam candidatas a tal
procedimento. E no fim, quando saem dos internamentos, saem a agradecer por
tudo o que foi feito e pela recuperação que tiveram.
Infelizmente, mesmo na presença das melhores
condições, como profissional de saúde, tenho que ter a humildade de aceitar que
há coisas que estão fora do alcance da ciência. Pelo menos para já. E como
considero que não devo cortar a liberdade de quem possa estar em sofrimento,
dou um sim, com muitas reservas, à eutanásia.
Finalizo com uma questão, que ainda não vi ninguém
responder e que, na minha ótica, é tão importante como o dizer sim…quem seriam
os profissionais de saúde a pôr termo à vida das pessoas? Como apenas falo por
mim, a minha resposta é “eu não”.
Fez um ano que vieste ao mundo, fez um ano que te
conheci sem ainda saber o papel que terias na minha vida.
Eras tão pequena, tão frágil, tão terna, que cada vez
que pegava em ti aproximávamo-nos cada vez mais. Tanto, ao ponto de não ter segurado
algumas lágrimas no momento em que os teus pais me convidaram para ser teu
padrinho.
Tens crescido a olhos vistos, da bebé indefesa estás
a tornar-te numa bebé reguila, irrequieta e com esse teu sorriso que encanta
toda a gente. E como acho piada a essa tua vontade de falares o que ainda não
consegues dizer.
Oficializamos a nossa relação, apesar de ter assumido
esse papel a partir do momento em que disse “sim”. Um papel ao qual estou já
familiarizado e ao qual irei tentar dar o meu melhor para, acima de tudo, estar
presente. É essa a maior e melhor prenda que podemos dar. Tentarei ajudar os
teus pais na tua educação, daquela maneira que eu acho que é a única de se
educar, pelo exemplo.
Ser padrinho é a experiência que mais desfruto, seja
com a Joana, com o João ou, agora, contigo. Tenho três afilhados que me
preenchem, que me encantam e que amo acima de tudo. Gostaria de estar com cada
um deles todos os dias. Sei que não é possível, ainda mais num ano atípico como
este, mas cada momento com eles é aproveitado ao segundo.
Inês, ainda és muito nova para perceberes as palavras
que te escrevo, estas e as outras já escritas, mas já entendes tudo o que o meu
olhar, a minha voz e o meu toque transmitem quando estou contigo.
Recentemente,, enfermeiros foram agredidos no Hospital
São João quando estavam em funções.
Recentemente uma professora foi agredida quando
estava em pleno local de trabalho a exercer as suas funções.
Estes dois casos, recentes e esquecidos, arrisco a
dizer mesmo por nós enfermeiros e professores, são exemplo de algo que vai
ocorrendo muito por esses hospitais e escolas do país.
Ontem aconteceu aquilo aos jogadores e equipa
técnica do Sporting. Não se fala de outra coisa, aqui dentro e aposto por esse
mundo fora. Como adepto do desporto, condeno veemente este tipo de atitudes e
lamento pelos profissionais envolvidos.
Mas que difere estas três situações? Nas duas primeiras,
profissionais exaustos devido a condições laborais muitas vezes precárias, são
vítimas de uma sociedade doente, em que impera a lei do quero, posso e mando.
No segundo caso, os profissionais, dos mais privilegiados a nível mundial,
foram vítimas, em primeiro lugar, duma pessoa doente e instável, em segundo
lugar devido a todos nós que seguimos o futebol e fomentamos o culto da guerra.
Este ano a época futebolística foi marcada, de forma
mais exacerbada, pela cultura do ódio, desde os principais intervenientes até
aos programas diários em que se fala de tudo menos do jogo. E com audiência.
Sinceramente, não lhes dou tempo de antena, fui habituado na minha vida
desportiva a respeitar o meu adversário da mesma forma que me respeito a mim,
sabendo ganhar e perder. O que aconteceu ontem era previsível que acontecesse
mais cedo ou mais tarde, fosse qual fosse o clube. Eu que adoro o futebol e o
meu Benfica, revejo-me cada vez menos num desporto de jogos sujos de
bastidores, em que os principais clubes, poucas dúvidas tenho, estão
envolvidos.
Temos uma sociedade com valores invertidos ou
adulterados, onde não há rei nem roque, em que se pensa que os interesses individuais
(não direitos) estão acima de tudo e todos e qualquer coisa vale para os conseguir atingir. As
pessoas querem tudo e por isso vivem insatisfeitas. Querem o que podem ter e o
que não podem. Querem até aquilo que não querem, apenas porque outros o têm.
Queremos, nos vintes, ter aquilo que os nossos pais conseguiram ao longo de uma
vida de trabalho e sacrifício.
A mim preocupa-me mais o que se passa diariamente com
o comum dos mortais, nos locais em que se formam as crianças que vão ser os
adultos de amanhã. Pais baterem num professor é das situações mais graves que
pode acontecer…pois vai fomentar que mais tarde se repita o que aconteceu
ontem.
Percebo o impacto do que aconteceu, é o fenómeno
do futebol. Temos que ter noção que esta lamentável situação não é a desgraça do
país, é consequência do desgraçado que ele está. Está na hora de deixarmos de assobiar para o lado, como se nada tivéssemos a ver com isto.
“Eduquem-se as crianças e não será preciso castigar
os homens” - Pitágoras