sábado, 29 de dezembro de 2018

2018, com todo o carinho, despeço-me de ti




Meu caro ano de 2018, peço-te desculpa pelo que vou afirmar, mas não há forma de dizer que foste um bom ano. Entre as coisas boas e as más, o peso destas últimas foi demasiado grande para poder ser de outra maneira.
Começaste cinzento, muito cinzento, com algo que te marcou pelo resto do tempo…ainda marca e continuará a marcar.
Há vários tipos de despedidas…as do dia-a-dia, às pessoas com quem lidamos diariamente, aquelas a que, porventura, menos importância damos. Há as despedidas de pessoas que sabemos que só voltaremos a ver daqui a muito tempo, daquelas cheias de saudosismo. E há aquelas despedidas, a que mais damos valor, um doloroso valor, que são para sempre.
E é nestes momentos que nos apercebemos da importância dos “até amanhã” ou dos “até logo” que dizemos a diário, quase sem os sentirmos, com uma displicência que a (falsa) certeza que temos de os voltar a dizer nos dá.
Ficas marcado, indubitavelmente, por me teres levado uma das pessoas mais importantes, daquelas com quem mais cresci, que mais ajudou a forjar o meu carácter e a quem muito devo. Só não fico chateado, porque creio ter sabido, ao longo dos anos, demonstrar todo o respeito, afeto e gratidão que tive e terei sempre pelo meu Mestre.
Foi um ano em que concluí mais um desafio no âmbito profissional, talvez aquele mais desafiador e difícil, mas ao mesmo tempo cativante. Além dos colegas de curso, conheci profissionais que me orientaram de uma maneira que apenas tenho que agradecer. Excelentes enfermeiros, que me dão a certeza que a luta que travamos é mais que justa. Quer os meus orientadores, quer os colegas dos serviços por onde passei, receberam-me como se fosse mais um da equipa, algo fundamental para levar a bom porto e com a motivação em alta este percurso.
Com estas duas experiências cresci, uma fez-me crescer pessoalmente, ao ter que levantar a cabeça rapidamente para dar continuidade a uma obra que não pode parar. Com a outra cresci profissionalmente, realçando-me a importância da qualidade de vida que podemos dar aos anos em que vivemos.
De resto, continuo a fazer o que gosto e quero junto dos meus doentes, contínuo a tentar dar um pouco de mim às crianças que me são confiadas, tudo isto no calor da família e dos amigos.
Para o Novo Ano, não posso pedir muito mais, pois já passei muito tempo privado do que hoje faz parte do meu quotidiano. Que assim continue e que daqui a um ano possa ter as pessoas que me são próximas junto a mim.
A todos os meus familiares, a todos os meus amigos, a todos os meus colegas, a todos os meus alunos e companheiros na Arte, desejo que tenham a capacidade de ir atrás e de cumprir os vossos sonhos. Se não estamos bem, a mudança que precisamos fazer está em nós, nunca no acaso da vida e nos outros. Temos que assumir a responsabilidade pela nossa felicidade, dar oportunidade e fazer com que ela aconteça.
A todos vós, obrigado por me acompanharem nesta aventura que é a vida e um Feliz Ano de 2019!

domingo, 16 de dezembro de 2018

O crime de ser enfermeiro


Esta semana parecia ficar marcada pelos ataques cada vez mais cerrados duma ministra sem escrúpulos, mentirosa e manipuladora, refugiada numa comunicação social alarmista, sensacionalista e pouco preocupada com os factos.
Porém, aconteceram duas situações daquelas que, de tão injustas, deviam de estar proibidas de acontecer.
Começo pela queda do helicóptero no dia de ontem. Preparava-me para sair de casa quando começaram as notícias sobre o desaparecimento da aeronave. Tive logo um mau pressentimento, que mais tarde viria a confirmar.
Acidentes acontecem todos os dias, ninguém está livre deles, mas acontecer a quem está em serviço, serviço que consiste em salvar vidas…não se faz. Toda a tripulação morreu em prol dos outros, como se fossem anjos em asas.
Daniela, não te conhecia, nunca tinha ouvido falar de ti, tal como muitos outros colegas que hoje choram a tua partida. Mas sei que és das nossas, não tenho a menor dúvida. Se há quem nos apelide de criminosos, apenas te deixo com um sincero e singelo “obrigado” por tudo, um tudo que são poucos a saber a sua verdadeira dimensão.
Sou enfermeiro e adoro o que faço. E se há algo que me deixa completamente realizado é ver a recuperação dos doentes. É para isso que lá estamos, mas nem sempre é possível.
Há umas semanas atrás o “Sr. J” abandonou o serviço após um período connosco. Saiu bem, pelo próprio pé, um senhor muito diferente daquele que tinha chegado até nós. Apesar do pensamento algo confuso que o acompanhava diariamente (como me fazia rir com aquela necessidade de adquirir sempre mais um determinado objeto), era um homem de bom coração, sempre com uma palavra de apreço, que me disse um dos “eu confio em si” mais sentidos que ouvi até hoje.
Saiu do serviço com uma promessa, que iria ver se o seu grupo onde tocava estava operacional e que iria vir à nossa festa de Natal para participar nela. Caso não estivesse a funcionar, viria ele na mesma. Ainda me lembro do sorriso com que nos deixou naquele dia e com a pele de galinha com que fiquei, característica minha nestas despedidas.
Quando me vieram falar do “Sr. J” esta semana, pensei que me iriam dizer “Ele vem à festa”…mas em vez disso, apanhei um murro no estômago. Sei que ficou impossibilitado de cumprir a sua promessa, que acredito que cumpriria. Nesse momento, e ainda inebriado pela violência do choque, revivi muitos dos momentos em que, durante um mês, trabalhei, convivi, chateei-me, sorri ou ouvi o “Sr. J”.
Com a devida distância profissional, considero que apenas conseguimos chegar aos doentes com afeto, sendo ele expresso das mais diversas maneiras. Por isso, estas partidas inesperadas sempre me abalaram um pouco, fico mais pobre com cada uma delas. Talvez seja por isso que me considerem uma pessoa cruel, um criminoso, talvez dos da pior espécie. Mas voltaria a cometer os mesmos crimes que tenho cometido, principalmente o de me ter tornado enfermeiro.
Daniela e “Sr. J”, descansem em paz, até um dia!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

A cruel passagem do tempo



14 anos, 14 longos anos…não imaginas o esforço que faço para manter viva a tua presença.
A imagem é-me mantida pelas inúmeras fotos, desde tenra avó até que te tornaste na mais sapiente delas todas. O que sempre foste, com ou sem experiência, foi atenciosa, carinhosa, uma cuidadora cuidadosa, devotada à família.
Da tua voz vou perdendo o som, tentando lembrar conversas longínquas que parece que tivemos ontem.
Do teu calor e do teu cheiro já não tenho ideia, bem tento, mas não recordo. Maldita memória que me atraiçoa.
O que não esqueço é o sentimento de segurança e de paz que me davas. Quando pequeno, o teu colo era porto de conforto, quando já crescido eras a voz da experiência cuja presença me tranquilizava.
Sei que não eras perfeita, mas na tua imperfeição foste a avó perfeita. É em ti, na tua maneira de ser, que baseio a forma em como cuido dos outros. Não me viste a tornar-me enfermeiro, na altura em que partiste ainda era um projeto muito fraquinho e inseguro do que seria. Das últimas imagens que tenho, eram as minhas visitas ao hospital para te ver em que tu dizias às tuas vizinhas de quarto que eu era enfermeiro…e eu cheio de medo em que alguma das enfermeiras te ouvisse! Já me questionaram o porquê de ter escolhido este caminho, ao que respondo que desde cedo tive essa ideia. Agora o porquê de a ter, cada vez mais tenho a certeza que foi por tua causa.
Estranha vida esta, quando precisaste não estava preparado para cuidar, agora que me sinto capaz já cá não estás. Acredito que fosses gostar no enfermeiro em que me tornei, pelo menos assim gosto de pensar.
Saudades são muitas, talvez a única coisa que me fizesse querer voltar atrás no tempo seria sentar-me uma última vez no teu colo, eu pequeno num dos lugares mais seguros do mundo.
Beijinho do teu neto

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Tragédia de Sabrosa...um lugar comum


 Lamentavelmente a tragédia bateu à porta duma família em Sabrosa, família esta que vivia com poucas condições segundo se consta.
O que aconteceu, infelizmente, tem ocorrido pontualmente a pessoas de melhor ou pior condição social.
De repente, lê-se e ouve-se muita indignação nas redes sociais (grande lugar para os opinadores de sofá) e nos jornais televisivos (em que o que interessa é aparecer, independentemente do que se diga).
Ouvi dizer que esta família era humilde, de gente trabalhadora, pronto, que bebia um bocado, mas que não foi por aí. Sai uma multidão, que até ontem devia de pensar que estas situações não existem, a reclamar casas para as pessoas que precisam.
Multidão esta que é a mesma que reclama contra o RSI, que reclama contra as ajudas socias de quem menos tem, que se alguma entidade ligada ao Estado desse uma casa a uma família carenciada seriam os primeiros a gritar a injustiça que seria uns terem que trabalhar para ter uma casa e outos não. A hipocrisia (só se vê quando se quer) e a bipolaridade (analisa-se as situações conforme o que interessa no momento) são duas caraterísticas muito portuguesas, não são apenas qualidades.
Bato na mesma tecla há muito tempo, somos, cada vez mais, um país de terceiro mundo com aparência de primeiro. No parecer, parecemos muito. Não há crianças e/ou adultos sem telemóvel, sem carro, sem roupas de marca, sem casa própria, tudo se consegue com aparente facilidade. Até os pais que se matam a trabalhar por dar luxos aos filhos acreditam na normalidade da situação.
Mas por trás desta fachada há um outro Portugal, um país de miséria de início do século XX, em que noções básicas de higiene, saúde ou condições habitacionais mínimas diferem um pouco do que a maioria de nós tem.
E estes casos existem à vista de toda a gente, todos nós sabemos de alguém que vive abaixo do que consideramos digno. E todos assobiamos para o lado, como se fossem invisíveis aos nossos olhos.
Estas situações deviam ser sinalizadas pelas entidades que mais perto delas vivem, que atuam no terreno. Não vou acusar ninguém, porque não sei quais as condições que o país dá aos profissionais responsáveis por estes casos para os resolver. Sou, isso sim, da opinião que, mesmo o país não dando condições para tal, se deva sinalizar os casos. O que não se deve fazer é saber-se das situações e nada se fazer, apenas porque nada se poderá solucionar.
A nível profissional são muitos os casos que nos passam pelas mãos, famílias idênticas às de Sabrosa, que de repente deixaram de ter condições para regressar ao domicílio, domicílio que até ao momento tinha servido. Aproveita-se a institucionalização das pessoas para que os serviços de saúde resolvam os problemas sociais da população. Além de se tratar e cuidar de um doente, as equipas lutam para proporcionar soluções sociais a estas pessoas. Depois temos as camas hospitalares e da RNCCI com pessoas saudáveis que não têm lugar para onde ir, e doentes que não têm uma cama para se deitar.
Depois é a velha máxima que utilizo, cada caso é um caso. Há pessoas que tiveram azar no meio em que nasceram, mas construíram a sua sorte, há outras que tiveram sorte no seio familiar e foram em busca do azar. E há as que nunca souberam sair do azar em que nasceram. Simplesmente nem todo o azarado é coitadinho.
Um conselho se me permitem. Quando acharem que há alguém que conhecem em risco social, comuniquem-no nos devidos sítios, de modo que as entidades competentes possam atuar.
O que aconteceu em Sabrosa é triste e poderia ter sido evitável, mas não sou ninguém nem conhecedor dos dados para poder dizer que a tragédia tem ou não a ver com a situação social da família. Tudo que pudesse dizer nesse sentido seria especulativo e sensacionalista.

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

A importância de quem está


O dia marcado para nos lembrarmos dos entes queridos que já cá não estão, recorda-me sempre a importância de passar o tempo com os que cá estão.
A vida é uma correria, as 24h diárias cada vez são mais curtas para se fazer tudo o que se quer (não confundir com o que se precisa fazer). As nossas exigências pessoais são cada vez maiores, queremos mais luxos, queremos uma casa melhor, um carro melhor, uma televisão melhor, o colégio para os filhos, milhentas atividades em que eles têm que ser os melhores dos melhores…esquecendo-nos de aproveitar os simples prazeres da vida.
Às vezes considero-me alguém pouco ambicioso, apesar de procurar fazer o melhor possível em todas as facetas da minha vida. Dou valor às pessoas e aos momentos que passo com elas. Esse é o motivo maior que me faz acordar todos os dias com vontade de enfrentá-los.
No trabalho, colegas e doentes, a maior lição sobre relações humanas. No Karate, amizades de toda uma vida e alunos que me desafiam diariamente. No seio familiar, a segurança e intimidade no seu expoente máximo. Nas minhas amizades, o carinho, a confiança, pessoas a quem devo muito do meu crescimento pessoal.
É o tempo que passo com eles todos que faz valer a pena. Mais do que os sítios onde vou de férias ou onde vou jantar, importa-me mais com quem o faço.
Como já disse, o tempo é curto, não precisa que o encurtemos mais. Às vezes custa, custa horas de sono a menos, mas se o faço é por dar valor às pessoas que me fazem trocar o descanso pelo prazer da sua companhia.
As pessoas que infelizmente já não tenho comigo…mal seria lembrar-me delas apenas hoje. Foram parte importante do meu passado e continuam comigo, levando-as a todas as pessoas com quem contato. Fui, sou e serei um prolongamento de tudo o que me transmitiram.
O que me deixa leve, de consciência tranquila, é o fato de ter aproveitado o tempo com essas pessoas ao máximo. Nem sempre passei todo aquele que queria, mas os momentos juntos foram passados de corpo e alma presentes.

"Don’t you cry for the lost
Smile for the living
Get what you need and give what you’re given
Life’s for the living so live it
Or you’re better off dead"


segunda-feira, 8 de outubro de 2018

O que de verdade importa


Estava a pensar escrever a minha opinião sobre o study case do escândalo CR7 ou das praxes criminosas, até que ontem fui assistir a um filme.
Como fã de cinema, ando mais ou menos por dentro das estreias ou dos grandes filmes que estão a chegar. Não foi o caso de ontem, um filme desconhecido, que nunca ouvira falar, lançado em Fevereiro de 2017 e, não sei porquê, parecia perdido (ou destinado?) ao esquecimento.
Surpresa das surpresas, saltou para o meu top 3 de filmes preferidos, ficando com o último lugar do pódio. Destronar “A Vida é Bela” ou “Dois é família” não é coisa fácil.
O que têm estes filmes em comum? Todos eles abordam situações dramáticas, mas com a qualidade que eu mais admiro no mundo, o humor.
O “The Healer” fala do dom de curar pessoas, sob a metáfora dum “curandeiro”. Que tem este filme de tão especial para me tocar desta maneira?
Por muito desesperante que seja uma situação, por muito que não se veja a luz ao fundo do túnel, cabe-nos a nós, simples cidadãos, transformar o mundo de quem passa por uma situação dessas.
Associamos o termo “curar” à condição de alguém ficar são, normalmente de algum mal físico. Porém, às vezes isso não é possível. Baixamos então os braços e deixamos simplesmente as coisas seguirem o seu rumo?
Curar a alma é, quem sabe, a tarefa mais difícil e mais importante quando a morte é algo cada vez mais palpável. Seja para uma possível recuperação, seja para um fim digno.
Ontem, ao assistir ao filme, sorri, daqueles sorrisos carregados de compreensão, às vezes acompanhados com uma lágrima (não foi o caso vá), recordando-me de algumas pessoas que tive o privilégio de conhecer e acompanhar enquanto enfermeiro. Pessoas de quem cuidei, pessoas que fiz rir e sorrir, pessoas que muito me ensinaram, sendo que a maioria já não se encontra entre nós. Anónimos de nome, mas cujas caras para sempre lembrarei. Não as consegui curar, foram elas que me foram curando.
Aconselho vivamente o filme, podem sair do cinema a sorrir ou a chorar, mas indubitavelmente mais enriquecidos enquanto pessoas.

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quarta-feira, 3 de outubro de 2018

27 anos de aprendizagem


Tudo o que eu sou devo à minha família, principalmente aos meus pais, que sempre tentaram orientar-me pelos caminhos que sentiam ser os melhores para mim. Foi assim que, nos finais de 1991, tiveram a sabedoria e a sorte de me levar a experimentar o Karate e a entrar na AKFAFE…ou talvez fosse apenas algo que tinha mesmo que ser. E mais do que me permitirem iniciar esta arte, foi graças ao apoio que sempre senti que fui permanecendo nela, mesmo quando o cansaço e as dúvidas apareceram.
Posso dizer, talvez sem exagerar, que passa do milhar o número de pessoas com quem partilhei treino a nível local, e são já uns milhares as que conheci durante toda a minha prática.
Inicialmente com o objetivo de ser uma atividade desportiva, descobri no Karate uma Arte Marcial cujo maior valor são os valores que transmite. Com toda a certeza, esses foram a minha maior medalha em toda a minha prática, que me fazem ter um sentimento de dívida eterna com esta arte. Recebi e continuo a receber tanto, que a minha ilusão aumenta a cada ano que passa, ainda mais do que no dia em que a iniciei.
Hoje não treino tendo em vista a conquista de pódios. Treino apenas para superar-me a mim mesmo e para conseguir ser exemplo para os mais novos, tentando ser veículo de transmissão dos ensinamentos que me foram passados estes anos todos e continuam a ser passados. Desafio muito maior do que a busca de medalhas.
Como sabe bem ver a energia contagiante de quem nos chega, sem nada saber, mas com enorme vontade de aprender. Ver o crescimento brutal, a todos os níveis, das nossas crianças, sempre na esperança que venham a ser pessoas de bem e que acrescentem algo de bom à sociedade. Esse é o nosso grande trabalho. Com a sociedade que temos, com uma falta gritante de valores, em que tudo é competição, em que tudo é inveja, em que tudo se quer de bandeja, creio que o Karate poderá dar um pequeno contributo para um mundo melhor.
O caminho, neste momento, está a ser feito ainda de coração pesado. O Sensei Marinho será sempre o meu exemplo, a pessoa em quem me inspirarei para inspirar os outros. Com ele cresci a aprender que antes de merecer o que seja, tinha que fazer algo por isso. Aprendi a não exigir nada, a saber esperar o meu tempo, a confiar no meu trabalho e a saber que o seu reconhecimento vem com o tempo, sem necessidade de me por em bicos de pés ou de bradar aos céus. Aprendi que a confiança se ganha com lealdade, com honestidade, com atitudes. E isso não acontece em poucos anos.
Mas o caminho faz-se caminhando, lado a lado com pessoas de máxima confiança (aquelas que talvez melhor me conhecem), com enorme vontade e com um sentimento de união que se consegue apenas no seio de uma família.







domingo, 9 de setembro de 2018

Mis vacaciones...


 
Hoy vuelvo a arriesgarme a escribir de nuevo en castellano, después de casi tres años sin hacerlo.
Hace días regresé a la ciudad que ,con el pasar de los años, se ha tornado una segunda casa. Es la segunda vez que regreso a Pontevedra como turista. Y la verdad es que los ojos con que miran los turistas los sitios son distintos de los ojos de las personas que los habitan.
Una persona me ha comentado que las ciudades son como las parejas, que nos acostumbramos a sus calidades, y estas se tornan invisibles a nuestros ojos. Pero están allá.
Mi relación con Pontevedra empezó de la misma manera con que me relaciono con los locales donde no quería estar. Fue difícil, no me gustó, solo veía lo malo, o mejor…no conseguía ver lo mejor que la ciudad tenia para ofrecerme.
Despacito, descubrí encantos escondidos, que estaban delante de mí. Empiezo por lo que más me gusta…las tapas. En Portugal se come muy, muy bien, pero allá, un modo distinto de comidas, también lo conseguimos hacer. Echo de menos tapear en una mesa llena de amigos, en una terraza en pleno verano. Las tapas en Portugal no saben a lo mismo que en España, lo siento.
Sigo para el centro histórico. Tal y cual como la ciudad, no es muy grande, pero muy acogedor, con todo muy cerca. Por las noches de viernes y sábados se llena de vida y colores, con los bares típicos de puerta en puerta.
Las fiestas…debo admitir que el pueblo gallego se divierte como nadie. Las fiestas de la ciudad, que se prolongan por más de una semana. La noche de los piratas entre otras. Y la principal, la Feria Franca, en que toda la gente vuelve a los tiempos medievales, de los caballeros, duques, damas, princesas y cruzados, con trajes de hacer envidia.
Hablo de seguida de las playas, las que serían las mejores del mundo si el tiempo fuera más estable y el agua más calentita. Locales escondidos del turismo voraz, salvajes, puntos de unión entre los montes y el mar. Aguas tranquilas, teñidas de un azul cristalino, que nos hacen acordar el paraíso. Y todo esto aquí tan cerca.
Termino con lo más importante que tenemos en nuestras vidas, independientemente de donde estemos…las personas. Si me enamoré de Pontevedra, lo debo a toda la gente que conocí, con quien viví, con quien trabajé o con quien fui de fiesta. Los abrazos y las sonrisas con que soy recibido, lo atropello de preguntas sobre cómo me va la vida (no por cotillear) o el sincero “vuelves?” me hacen ver que dejé mi huella en el corazón de las personas…así como dejaron en el mío.
Como dije a mi jefa, la llamada que le hice hace tres años  a decirle que me marchaba ha sido la más difícil que tuve que hacer en mi vida. La voz embargada, el temblor de las manos, el frio en la barriga eran señal que me preparaba para marchar con toda la ilusión del mundo, pero con un peso en el corazón por toda la gente, por todos los sitios, por todas las experiencias que me hicieron crecer en Pontevedra.

terça-feira, 31 de julho de 2018

Caminhando pela vida


Já muito escrevi sobre nós, sobre ti, mas estar contigo relembra-me sempre o porquê de o fazer.
Está quase a fazer 16 anos desde que nos conhecemos e pode-se dizer que foi uma amizade à primeira vista. Como qualquer outra, ela teve que ser construída, pedaço a pedaço até chegar ao que é hoje em dia...deixando de ser como qualquer outra.
Vivemos intensamente (intensidade à nossa maneira) os ditos melhores anos da nossa vida, apesar de eu acreditar que o melhor está sempre por vir. Mas algo de verdade tem essa ideia, pois Viana será sempre a origem das nossas raízes.
Fizemo-nos à vida, vida essa que nos levou para longe um do outro. Porém, cada reencontro é sentido com a cumplicidade de quem se vê todos os dias e com a saudade que demasiados quilómetros acalentam.
A tua amizade é uma terapia para mim (não vale cobrar consulta), das fortes amizades que tenho foi aquela que mais me permitiu crescer no que ao ser amigo diz respeito. Começou em Viana, deambula entre Barcelona, Pontevedra, Venade, Fafe…em qualquer lugar que nos permita largas conversas e altas gargalhadas. E como sorrio ao saber-te feliz...e mais careca!
O segredo de tal afinidade…será só um? Começo pelo que me parece mais importante, o respeito, enorme respeito, que sempre tivemos pelas nossas divergências. Só assim, a tua opinião teve o peso que teve (e tem) em algumas decisões que tomei, mesmo quando iam contra o meu modo de pensar.
Depois acho que temos uma amizade especial devido à absurda simplicidade que ela acarreta. Apesar dos anos terem passado, de nos termos tornado adultos, ainda vejo em nós muito dos dois miúdos que se conheceram com 18 anos.
Numa sociedade cada vez mais com os valores ausentes ou invertidos, és tu, muitas vezes, que me fazes ver que não remo sozinho contra a maré. E assim, caminhando pela vida, nesta encruzilhada de rumo incerto, seguimos juntos apesar da distância que nos separa.
Até breve


quinta-feira, 26 de julho de 2018

Dez anos de um amor maior


Gostaria de começar este texto a dizer que não nasci para ser enfermeiro. Cresci sem saber ao certo o que queria ser quando fosse grande…jogador da bola como toda a gente; bombeiro ao ter o quartel a dois passos de casa, sendo local de visitas e brincadeiras frequentes; Jedi, o verdadeiro herói das galáxias, quando a fantasia reinava no meu pensamento; professor de educação física (talvez a profissão mais próxima do meu perfil e preferências) …e não me lembro de muito mais.
Hoje em dia identifico-me em dois papéis, enfermeiro e karateca (praticante e instrutor). Enquanto crescia, enquanto sonhava com muitas coisas, tornei-me sem dar conta em karateca, não apenas dentro do dojo, mas principalmente fora dele. Não pretendo falar neste texto sobre o que já falei muito, mas esta Arte foi a base para a formação dos princípios e valores que defendo, onde aprendi o verdadeiro valor da amizade e do “um por todos e todos por um”.
Voltando-me agora para o papel de enfermeiro, este começou a ganhar forma lá pelo 10º ano quando decidi que era o curso que queria, sem fazer a mínima ideia do que era (é) ser enfermeiro. Uma ideia em bruto, completamente em bruto.
Passo seguinte, deu-se com a entrada na universidade, onde me tornei vianense de adoção. Foram anos incríveis, onde conheci gente para a vida, que ainda hoje considero como melhores amigos, pese a distância que nos separa. Quanto à Enfermagem, não encontrei nestes anos a chama que me fizesse sentir que estava no meu lugar, naquilo que queria ser. Sem culpar ninguém, não tive nesse período um exemplo que me fizesse pensar “é este o enfermeiro que quero ser”.
Até que chegou o quarto e último ano e tive três orientadoras, todas com perfis diferentes, que me cativaram para ser enfermeiro. Enf.ª Maria do Carmo, Enf.ª Carla e Enf.ª Isabel (esta, quem sabe, a pessoa que num mês me marcou mais que qualquer outra nos anos anteriores, aquela com quem mais cresci).
Termino o curso e estou um ano a percorrer o deserto, em busca duma oportunidade em qualquer zona do país. Uns “biscates” na área não chegavam para fazer-me sair do desânimo que crescia em mim. Pelo meio, uma proposta que tive a gentileza de recusar, por serem dessas que nos fazem corar de vergonha.
Até que recebi uma chamada do país vizinho, a perguntarem-me se queria iniciar funções no dia seguinte. Não fui logo nesse dia, fui uns dias depois. Por lá, pela minha Pontevedra, fiquei sete anos, anos em que evoluí pessoal e profissionalmente e aprendi, aos poucos, a gostar e abraçar a profissão que tinha escolhido. Num local de trabalho complicado, em que muitas vezes não havia mãos a medir, ganhei capacidade de trabalho e sacrifício. Com humildade, creio ter sabido absorver as aprendizagens que as minhas colegas mais velhas me proporcionaram. E com muitas outras, algumas a iniciar este caminho como eu, crescemos juntos, com apoio constante, limpando as “lágrimas” nos momentos difíceis, sorrindo nas nossas muitas alegrias.
Aquela casa, aquela gente, sempre as levarei no meu coração. Se sou enfermeiro, foi pela oportunidade que me deram, e acredito ter pago a confiança com a minha dedicação durante os anos em que la estive.
Sete longos aos depois, quando já poucas esperanças tinha, abriram-me de novo uma porta, aquela pela qual tanto ansiava. Estava de regresso a casa.
Nesta nova etapa, mais uma vez, fui recebido de braços abertos e abri-me ao conhecimento que os novos colegas me tinham para dar. O Karate ensinou-me que a aprendizagem é para a vida e isso transfiro para a minha profissão. De todos tenho algo a receber.
Num novo serviço, com um doente tipo bastante diferente ao que estava habituado, renasci como enfermeiro. Mais do que o conforto, mais do que o substituir as pessoas no que não podem fazer, mais do que as técnicas e a medicação, mais do que o cuidar (que tanto gosto e é a base da Enfermagem), descobri que o prazer maior é o de reabilitar. Foi algo que foi crescendo sem eu dar conta, mas dá-me um gozo tremendo ver a qualidade de vida que se pode dar às pessoas, sendo preciso tão pouco…as nossas mãos, a nossa vontade (muitas vezes superior à dos doentes), o nosso saber e a nossa crença. Esta, talvez, a mais importante, acreditar que a pessoa vai ficar melhor, mesmo que, ao receber a pessoa ao nosso cuidado, muitas vezes não saibamos como será isso possível…mas é.
Fez há uns dias dez anos em que posso dizer “sou enfermeiro”. Digo-o com orgulho, não em mim, mas em toda a classe a que pertenço. Por muitas dúvidas que nos assolem, por muito maltratados ou pouco reconhecidos que sejamos (socialmente…ou politicamente), por muito que a esperança se desvaneça…acreditem, são especiais.
Não vou aqui falar em todos os sacrifícios que a nossa profissão acarreta, já falei muitas vezes. Apesar de saber que o meu país nunca vai ter condições para me pagar o que acho justo, regressei porque quis e não deixo de ir com um sorriso para o meu trabalho. Pelos meus colegas e pelos meus doentes. Que me perdoem os meus colegas, mas principalmente por estes. É por eles e para eles que lá estamos, a maioria dá-nos o valor que merecemos e são reconhecidos. Embora não me alimente nem pague as contas com isso, a melhor paga que tenho pelo meu trabalho são os “obrigados” e as lágrimas dos utentes na hora da alta.
Já fiquei com pele de galinha e já me emocionei com algumas despedidas. Porque, parafraseando alguém, somos gente que cuida de gente, e ao tocarmos alguém estamos a deixar que nos toquem.
Não sei o que me reserva o futuro, desejo apenas que a paixão e amor que sinto pelo que faço se mantenham.

segunda-feira, 9 de julho de 2018

O início...de uma nova caminhada



“Mais importante que o destino, é o caminho percorrido para lá chegar!”
 Talvez seja esta a frase que melhor resume a empreitada que eu e mais vinte e nove colegas iniciamos em Outubro, quando nos candidatamos a ser Enfermeiros Especialistas em Reabilitação.
Passados dez meses de um processo de aprendizagem intensivo, duro e de sacrifícios, estou longe de me sentir Especialista. Nunca considerei que cursos ou cartões dessem direito às designações neles contidos. Acima de tudo, é o dia-a-dia, é a experiência, é o pôr em prática os conhecimentos que nos pode levar ao merecimento de tal designação.
Por isso não me considero especialista, sinto-me, isso sim e ainda antes de iniciar este percurso, enfermeiro de reabilitação. Foi o sentir que o que fazia para ajudar os meus doentes não era suficiente, que podia fazer mais e melhor, que me fez entrar neste desafio.
Sempre o disse e acredito piamente nisso, só evoluímos, seja pessoalmente ou profissionalmente, se sairmos da nossa zona de conforto. O que vem fácil, vai fácil ou não tem valor.
E o que destaco destes meses todos, são as pessoas que conheci, desde os meus colegas, aos professores e orientadores.
A primeira palavra, como não podia deixar de ser, é para vocês meus caros colegas. Companheiros de sacrifícios, de estudo, de trabalhos, de angústias…mas também de risos e sorrisos, de solidariedade, de alegria. Apesar de ter sido voluntário involuntariamente, ser o vosso delegado de turma foi um privilégio. Porque é que digo isto? Tentei conhecer todos, ser um elo de ligação e de apoio para o que precisassem. Independentemente de haver relações mais fortes que outras, de todos levo algo, cresci com cada um de vocês. Parabéns e obrigado.
Sigo para os Professores, destacando a Professora Esperança, o Professor Fernando e a Professora Manuela, que nos orientaram de mais perto, mas nunca esquecendo todos os que nos deram o seu contributo. Pessoas de com grande saber acumulado, mas acessíveis e disponíveis para nos ajudarem.
As próximas palavras vão para todos os meus orientadores de estágio, responsáveis máximos pela minha evolução, que pelo exemplo foram e são modelos que pretendo seguir no meu percurso profissional.
Enf. Nuno e Enf.ª Fernanda (Gaia); Enf. Jorge (Braga); Enf.ª Graça e Enf.ª Ana (Cabeceiras); Enf. Vasco e Enf. Aníbal (Póvoa de Varzim)…estes sim, considero Enfermeiros Especialistas em Reabilitação. Foram fonte de aprendizagem, de reflexão, de conselhos, deram-me motivação para exercer ainda com mais vontade a nossa nobre profissão, encorajando-me a assumir sem receio os desafios que a minha vida profissional me puser à frente. A minha enorme gratidão para todos.
Não esqueço ainda todos os colegas que, apesar de não estarem diretamente na minha orientação, colaboraram nela e fizeram-me sentir membro integrante das equipas por onde passei.
Estas foram as pessoas que acompanharam de perto todo o meu percurso formativo, mas houve outras que não podem ficar sem uma referência.
Os primeiros, teriam que ser sempre eles, os meus pais. Por me apoiarem desde o primeiro momento, pela preocupação e interesse constante, pela compreensão nos momentos de maior impaciência resultantes das diminutas horas de sono, por tudo.
Palavra maior também para todos os meus colegas do trabalho, pela sobrecarga que a minha maior ausência do serviço provocou. O que me levou a dar tudo foi também o não querer que o vosso esforço fosse em vão. Se cheguei a bom porto, a vocês o devo. Isso nunca esquecerei.
Aos meus amigos, a esses, além do obrigado pelo apoio incondicional, as minhas desculpas. Pelas ausências ou pelas presenças com a cabeça noutro lugar.
Sónia Marinho e Márcio Carvalho, este meu percurso coincidiu com a nossa época mais difícil. Ter o apoio dos dois foi fundamental para poder desligar-me o possível do Karate quando assim me foi exigido. Sabendo que tudo correria dentro da normalidade. Sempre AKFAFE.
Gratidão é palavra a que dou muita importância. Devido a ela estou em dívida com todos vocês.
Pode-se pensar que isto é o fim…mas não o sinto assim. Para mim é apenas o começo de uma nova fase. Mudei, mudei a minha maneira de ser, estar e ver a enfermagem. Mais importante que ser especialista, é ser especial, será sempre esse o meu repto em tudo o que faça.
E não tenho dúvidas, as pessoas deste grupo têm tudo para serem especiais…sejam felizes no que fazem e não se esqueçam, mais importante que dar anos à vida…é dar vida aos anos.
Um sentido abraço a todos,
Jorge Gomes




sexta-feira, 8 de junho de 2018

Já passaram 34...




Uma breve pausa para um breve agradecimento.
Um sincero obrigado a todas as pessoas que, das mais diversas formas, me felicitaram pelos meus 34 anos. Um especial para aqueles que estiveram presentes, mas também para todas as mensagens daqueles que estão presentes todos os dias mesmo estando longe.
Um ano mais velho, um ano de real crescimento. Sem dúvida alguma, foi aquele em que mais cresci, pessoal e profissionalmente. Sinto-me hoje, algo diferente de há um ano atrás.
Profissionalmente, encontro-me ainda no maior desafio que me propus até hoje. Um desafio exigente, de quase exaustão, mas que, acredito, está a dar-me as ferramentas (e pensamento) necessárias para ser melhor enfermeiro. Uma aprendizagem da responsabilidade de muitas pessoas, a quem já agradeci, mas fá-lo-ei mais personalizadamente mais à frente.
Pessoalmente, cresci e aprendi com uma das maiores perdas da minha vida. Nem sempre é fácil levantar a cabeça ou seguir em frente, mas há alturas em que não se pode parar. Descobri uma resiliência que desconhecia, mas aprendi que a vida é curta para deixarmos para amanhã o que deve ser feito hoje. Estar com quem devemos, dizer o que sentimos, dar o valor às pessoas enquanto estão connosco. Só assim fará sentido o que se disser depois.
Ambas as situações levaram à maior mudança em mim. A minha visão, não a de ver apenas com os olhos, mas a de ver e sentir quem foi o meu suporte quando mais precisei. Algumas boas surpresas…algumas revelações.
Por isso o meu tempo, aquilo que de mais precioso tenho, passou a ser dado às pessoas que me fazem sentir bem, pretendido e acarinhado. A elas, que sabem quem são, dou o meu mundo.
Para terminar, farei menção particular apenas a uma mensagem que me enviaram. Já fora de horas (nunca o é), quando já me preparava para dormir, chegaram-me as seguintes palavras (apenas um excerto da mensagem):

Como amigo, apenas quero que tenhas sempre em mente que a vida é mais curta do que aquilo que parece, por isso devemos tirar o máximo partido de todos os momentos que nos fazem viver cada dia da melhor forma. Não há homens de ferro, mas há homens sinceros e honestos e que dizem mais quando não falam.
Espero que não te foques apenas em dar o exemplo, já o fazes inconscientemente. Sê tu mesmo e continua a ser quem és.

Um amigo, um rapaz que vi crescer, que se tornou um homem e que neste momento é um exemplo para mim. Pelo coração que tem, pela força que demonstra e pelos princípios pelos quais se rege. Se já ia dormir de coração cheio, permitiste-me adormecer com um sorriso.

Obrigado a todos!


quarta-feira, 30 de maio de 2018

Muitas certezas...uma decisão cheia de dúvidas




Muito se tem discutido sobre a eutanásia nos últimos dias, temos ouvido e lido diversas opiniões de ambos os lados e todas me merecem o devido respeito. O único senão é que não me parece que seja um tema para tantas certezas, seja de que parte for.
Eu pelo menos não as tenho, consigo arranjar prós e contras para qualquer uma delas.
Já vivi situações que me fariam concordar, como também já passei pelas situações que me fariam pensar o contrário.
Acho que, acima de tudo, temos que contextualizar a eutanásia e contextualizar o país em que estamos.
Primeiro, uma das ideias que me parece muito presente, é que a eutanásia vem para “exterminar” as pessoas em fim de vida, sem perspetivas de cura. Aqui entram em cena os que defendem (e muito, muito bem, tal como eu defendo) os cuidados paliativos. Acredito piamente que com cuidados paliativos de qualidade é possível proporcionar um fim de vida digno a quem vê o seu tempo chegar ao fim devido a doença. Aqui entram em cena os que dizem que há situações que não há assistência que valha a quem está em tal posição de forma a mitigar o seu sofrimento. Não discuto, não sou especialista na área, nem nunca trabalhei num serviço especializado em paliação.
O grande cerne da questão, nesta área, é a tal contextualização do nosso país. Temos um país que permita a todas as pessoas em fim de vida e em sofrimento ter acesso a este tipo de cuidados? Não, não temos. Temos que lutar por isso? Claro que sim, acho fundamental a existência duma rede de cuidados paliativos de qualidade que abranja todo o país, de modo a dar resposta a todos os casos. Nova pergunta, alguma vez iremos chegar a esse ponto? Não gosto de futurologia, penso que não, mas não o posso afirmar.
Contudo temos um problema, até que esse dia seja palpável teremos muitas pessoas a falecer em sofrimento. Infelizmente, imagino que haja muitos doentes a ter uma morte pouco digna por este país fora, seja em situação de doença terminal ou aguda.
Já trabalhei num serviço (fora de Portugal) que não era de paliativos, mas que recebíamos doentes em fim de vida. Alguns casos conseguíamos dar uma resposta adequada, noutros não e quando tentávamos enviar os doentes para um local mais apropriado eram-nos fechadas as portas. Diziam que não havia camas ou não valia a pena, que os poucos recursos que tínhamos eram suficientes…não o eram. Aprendi a lidar com dois tipos de morte, a digna e aquela pela qual espero um dia não passar...reformulo, com esta não consegui aprender a aceitá-la.
Depois temos os outros casos, casos extremos que quem fala em cuidados paliativos parece esquecer que existem. Os tais em que a pessoa decide que não quer viver mais na situação em que se encontra, como são os casos, só como exemplo, das tetraplegias. Aqui é que esbarramos num muro de crenças que, a meu ver, deve-se deitar abaixo. Podem ser até situações em que não haja sofrimento físico...mas todos sabemos que não existe apenas esse. Eu, Jorge, pessoa autónoma, com família, amigos, trabalho etc, digo neste momento que não quereria viver numa condição em que apenas pudesse mexer a minha boca ou os meus olhos. Seria uma mente presa num corpo morto. E são estes casos, acima de tudo, em que acho que apenas quem passa por eles sabe verdadeiramente a agonia em que vive, que deviam de ter o direito a ter outra opção. Porque quem sou eu para dizer que os meios existentes para ajudar um tetraplégico são suficientes para acabar com o sofrimento em que vive? Além que todos sabemos que pessoas nestas situações com os meios dum Christopher Reeve ou dum Stephen Hawking são raras.
Quero deixar aqui a salvaguarda que ninguém com uma depressão amorosa ou algo parecido se inclui nos critérios para a eutanásia. Um dos argumentos que vejo a ser dado a favor é que o número de pedidos de pessoas para morrer é cada vez maior. Calma, muita calma. Se assim fosse, talvez metade das pessoas internadas em serviços de saúde seriam candidatas a tal procedimento. E no fim, quando saem dos internamentos, saem a agradecer por tudo o que foi feito e pela recuperação que tiveram.
Infelizmente, mesmo na presença das melhores condições, como profissional de saúde, tenho que ter a humildade de aceitar que há coisas que estão fora do alcance da ciência. Pelo menos para já. E como considero que não devo cortar a liberdade de quem possa estar em sofrimento, dou um sim, com muitas reservas, à eutanásia.
Finalizo com uma questão, que ainda não vi ninguém responder e que, na minha ótica, é tão importante como o dizer sim…quem seriam os profissionais de saúde a pôr termo à vida das pessoas? Como apenas falo por mim, a minha resposta é “eu não”.

domingo, 27 de maio de 2018

O primeiro ano do resto da tua vida


Querida Inês,

Fez um ano que vieste ao mundo, fez um ano que te conheci sem ainda saber o papel que terias na minha vida.
Eras tão pequena, tão frágil, tão terna, que cada vez que pegava em ti aproximávamo-nos cada vez mais. Tanto, ao ponto de não ter segurado algumas lágrimas no momento em que os teus pais me convidaram para ser teu padrinho.
Tens crescido a olhos vistos, da bebé indefesa estás a tornar-te numa bebé reguila, irrequieta e com esse teu sorriso que encanta toda a gente. E como acho piada a essa tua vontade de falares o que ainda não consegues dizer.
Oficializamos a nossa relação, apesar de ter assumido esse papel a partir do momento em que disse “sim”. Um papel ao qual estou já familiarizado e ao qual irei tentar dar o meu melhor para, acima de tudo, estar presente. É essa a maior e melhor prenda que podemos dar. Tentarei ajudar os teus pais na tua educação, daquela maneira que eu acho que é a única de se educar, pelo exemplo.
Ser padrinho é a experiência que mais desfruto, seja com a Joana, com o João ou, agora, contigo. Tenho três afilhados que me preenchem, que me encantam e que amo acima de tudo. Gostaria de estar com cada um deles todos os dias. Sei que não é possível, ainda mais num ano atípico como este, mas cada momento com eles é aproveitado ao segundo.
Inês, ainda és muito nova para perceberes as palavras que te escrevo, estas e as outras já escritas, mas já entendes tudo o que o meu olhar, a minha voz e o meu toque transmitem quando estou contigo.
Parabéns pelo teu primeiro aniversário!
Beijinho do padrinho


quarta-feira, 16 de maio de 2018

Assobiar para o lado...amanhã é outro dia


Recentemente,, enfermeiros foram agredidos no Hospital São João quando estavam em funções.
Recentemente uma professora foi agredida quando estava em pleno local de trabalho a exercer as suas funções.
Estes dois casos, recentes e esquecidos, arrisco a dizer mesmo por nós enfermeiros e professores, são exemplo de algo que vai ocorrendo muito por esses hospitais e escolas do país.
Ontem aconteceu aquilo aos jogadores e equipa técnica do Sporting. Não se fala de outra coisa, aqui dentro e aposto por esse mundo fora. Como adepto do desporto, condeno veemente este tipo de atitudes e lamento pelos profissionais envolvidos.
Mas que difere estas três situações? Nas duas primeiras, profissionais exaustos devido a condições laborais muitas vezes precárias, são vítimas de uma sociedade doente, em que impera a lei do quero, posso e mando. No segundo caso, os profissionais, dos mais privilegiados a nível mundial, foram vítimas, em primeiro lugar, duma pessoa doente e instável, em segundo lugar devido a todos nós que seguimos o futebol e fomentamos o culto da guerra.
Este ano a época futebolística foi marcada, de forma mais exacerbada, pela cultura do ódio, desde os principais intervenientes até aos programas diários em que se fala de tudo menos do jogo. E com audiência. Sinceramente, não lhes dou tempo de antena, fui habituado na minha vida desportiva a respeitar o meu adversário da mesma forma que me respeito a mim, sabendo ganhar e perder. O que aconteceu ontem era previsível que acontecesse mais cedo ou mais tarde, fosse qual fosse o clube. Eu que adoro o futebol e o meu Benfica, revejo-me cada vez menos num desporto de jogos sujos de bastidores, em que os principais clubes, poucas dúvidas tenho, estão envolvidos.
Temos uma sociedade com valores invertidos ou adulterados, onde não há rei nem roque, em que se pensa que os interesses individuais (não direitos) estão acima de tudo e todos e qualquer coisa vale para os conseguir atingir. As pessoas querem tudo e por isso vivem insatisfeitas. Querem o que podem ter e o que não podem. Querem até aquilo que não querem, apenas porque outros o têm. Queremos, nos vintes, ter aquilo que os nossos pais conseguiram ao longo de uma vida de trabalho e sacrifício.
A mim preocupa-me mais o que se passa diariamente com o comum dos mortais, nos locais em que se formam as crianças que vão ser os adultos de amanhã. Pais baterem num professor é das situações mais graves que pode acontecer…pois vai fomentar que mais tarde se repita o que aconteceu ontem.
Percebo o impacto do que aconteceu, é o fenómeno do futebol. Temos que ter noção que esta lamentável situação não é a desgraça do país, é consequência do desgraçado que ele está. Está na hora de deixarmos de assobiar para o lado, como se nada tivéssemos a ver com isto.
“Eduquem-se as crianças e não será preciso castigar os homens” - Pitágoras